Ceará

Coluna

Precisamos nos apropriar da nossa história para garantir soberania e identificar os inimigos do povo

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A construção do Brasil de Fato, fundado em 2003 no Fórum Social Mundial, segue sendo um desafio de trabalhadores da comunicação e movimentos populares na batalha das ideias. - Brasil de Fato Ceará
Devemos assumir as rédeas de nosso destino. Seremos nós os escritores ou deixaremos para os patrões?

Continuando as reflexões lançadas no texto anterior. Para combater o bolsonarismo fascista, a extrema direita e o conservadorismo em nosso país e no mundo, talvez o primeiro passo seja o da nossa própria emancipação. Parece que já somos, eu sei, mas na prática somos mesmo? Se olhamos no dicionário o significado de emancipação, encontramos que se refere a qualquer tipo de libertação, alforria, independência. Mas como podemos dizer que somos livres se, por exemplo, estamos presos a uma lógica de trabalho que é voltada para os lucros dos patrões, enquanto nós mal conseguimos o mínimo para sobreviver?

Para uma libertação de fato precisamos estar conscientes de nossa história, é preciso que compreendamos as várias violências que formaram nosso país, entender que a Europa, sobretudo Portugal, roubou descaradamente por anos muitas de nossas riquezas, entender que a forma como a economia brasileira se organiza hoje, ditada pelo agronegócio e pelos bancos (principalmente, mas não apenas) e apresentada a nós como uma coisa boa pela imprensa comercial só serve para aumentar ainda mais o lucro deles enquanto nossa vida fica cada vez mais precária. Basta reparar, qualquer medida do governo que seja no sentido de melhorar um pouco as condições de vida do povo são prontamente atacadas, criam-se notícias falsas e convencem a maioria de que, na verdade, aquilo é ruim para a gente, ou ainda, quando o governo propõe uma política que visa tornar mais justa a realidade em nosso país, como é o caso da taxação das grandes fortunas (algo que já rola nas maiores economias do mundo), eles lá se juntam e criam outra leva de notícias falsas para nos convencer de que é algo ruim, por isso, vemos a classe média que acha que por ter uma renda melhor e melhores condições de vida que a classe trabalhadora serão atingidos, ou mesmo vemos pessoas em situações bem mais precárias, como motoristas de aplicativo que trabalhando mais de 10h por dia em um carro alugado ficam defendendo os interesses dos que usam jatinhos e passam o dia curtindo seus milhares de privilégios.


Em agosto, a batalha das ideias teve um novo marco com a distribuição da 1ª edição do Jornal Periferia Viva. O jornal é uma iniciativa de comunicação popular que visa fortalecer vínculos. / Ilustração Marcela Nicolas

Dito isso, um campo de batalha muito importante hoje na luta de classes, na construção de uma sociedade nova, sem classes, onde todas as pessoas possam viver bem, trabalhar o essencial para uma boa vida e sem a destruição do planeta, é a batalha das ideias. Precisamos e podemos fazer isso de forma casada com a nossa emancipação. Um mecanismo essencial para nossa emancipação é estudarmos, nos informar com qualidade e entender de nossa conjuntura, e para fazermos isso temos que acessar e consumir conteúdos de qualidade e que confiemos, que estejam alinhados com a defesa da classe trabalhadora em todas as suas esferas.

Então precisamos procurar veículos de comunicação de confiança como o Brasil de Fato, a Carta Capital ou o Opera Mundi. Que procuremos assistir filmes (para além dos documentários) que falem sobre nossa história como Marighella (2019), Uma história de amor e fúria (2013) ou o aclamado Ainda estou aqui (2024). Na nossa literatura tem tanta coisa que o Brasil já produziu e segue produzindo que é até difícil sugerir algum para começar, mas um bem interessante seria O povo brasileiro de Darcy Ribeiro, mas vale ficar de olho no que tem editado e lançado editoras como a Expressão Popular, Boitempo, Elefante e Ubu. Tem ainda uma boa revista que vale acompanhar que é a Jacobin Brasil.

Se você é uma pessoa mais das redes sociais eu diria para acompanhar os perfis de movimentos como o MST, Movimento Brasil Popular, Levante e MAB; de entidades como e articulações como a ANA e ASA para questões relacionadas ao campo e agroecologia; Tricontinental, ALBA, Assembleia Internacional do Povos e Fundação Rosa Luxemburgo para ampliar os olhares sobre política, sobretudo, na Améfrica Ladina, como diria a grandiosa Lélia Gonzalez. São muitas as referências que podemos trazer, mas essas dão um panorama inicial e abrem o contado com outras.

Nem estou dizendo para você largar os produtos da indústria cultural, não é sobre isso, mas podemos ampliar nosso olhar e compreender melhor a realidade que nos cerca quando acessamos conteúdos críticos para além dos que são focados em entretenimento. Falo por experiência própria, amo assistir animes e séries diversas (diversas mesmo, indo de série policial até fantasia) em streamings, mas também leio livros de teoria política e sociologia, acompanho produções culturais nacionais nas mais diversas linguagens como teatro e cinema, sigo portais de notícias que apresentam uma visão de esquerda dos fatos ou, pelo menos, com um olhar mais progressista, que não mentem para favorecer os que estão no poder. Veículos de esquerda, por exemplo, mesmo tendo apoiado a eleição de Lula fazem as críticas necessárias ao seu governo, problematizam as falhas, diferente de veículos de direita que dificilmente questionam as políticas de governos de direita como o de São Paulo.

Essa é uma ação simples que você faz para se emancipar, mas que, ao mesmo tempo, apoia uma ação coletiva de emancipação social, fora que ao consumir conteúdos críticos você passa a colaborar com uma maior criticidade das pessoas ao seu entorno, indicando filmes, livros e etc para elas, fortalecendo a consciência coletiva e contribuindo para a transformação do mundo.

A batalha das ideia é uma luta muito difícil, mas a cada pessoa que se engaja nela é um passo importante que damos na direção de um Brasil e um mundo sem violência ou guerra, sem fome, sem preconceitos e voltado para o desenvolvimento coletivo, sustentável e soberano.

*Lívio Pereira é trabalhador da cultura e militante social, escreve para o BdF há mais de um ano.

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato. 

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Edição: Francisco Barbosa