Ceará

Agronegócio

Artigo | Chapada do Apodi é ameaçada pelo avanço do agronegócio no Ceará e conflitos aumentam

Estudos demonstram como o agronegócio é prejudicial à continuidade do modo de produção camponês na Chapada do Apodi

Limoeiro do Norte |
Perímetro Irrigado na Chapada do Apodi/Limoeiro do Norte - Arquivo MST

Um estudo recentemente divulgado pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) revela que houve, entre 2023 e 2024, um acréscimo de 2,5 mil hectares de área plantada na Chapada do Apodi, considerando os municípios de Limoeiro do Norte, Quixeré e Tabuleiro do Norte. Juntos, somam 18.384 hectares de área plantada, sobressaindo-se os cultivos alinhados ao modelo produtivo do agronegócio.

Esse indicador acende um alerta importante quanto à expansão do agronegócio nessa região, que é o principal celeiro da agricultura capitalista no estado do Ceará. E evidencia uma reconfiguração recente dos usos da terra na Chapada do Apodi, para além da fruticultura irrigada, que desde 1990 recobre a área de monocultura mediante intenso uso de agrotóxicos.

A Chapada do Apodi continua sendo o filé do agronegócio no Ceará

Para além das frutas, hoje percebemos fortemente a expansão do agronegócio dos grãos, com foco no algodão, mas com cultivos também de soja, sorgo e milho. É o único lugar do Ceará que se planta algodão e soja em larga escala, nos moldes do que observamos no Cerrado, por exemplo. Isso não existia há algumas décadas.

Uma grande empresa vem sendo protagonista nesse processo recente, cultivando algodão transgênico em milhares de hectares, os quais são destinados para a produção têxtil. Além de fazendas próprias, essa firma tem arrendado fazendas de grandes empresas da fruticultura, até então desativadas, para plantar algodão.

Há, nitidamente, uma expansão da área plantada com algodão e demais grãos - e com isso uma expansão do latifúndio e da concentração hídrico-fundiária. Igualmente, expande-se o desmatamento para dar lugar aos monocultivos, resultando na morte da biodiversidade.

Registra-se, ainda, o aumento da área plantada com pastagens para o gado, com o cultivo de plantas forrageiras para alimentar os rebanhos bovinos. Isso ocorre dentro e fora do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi, muito em função da atuação de uma grande empresa do setor de laticínios, que concentra nessa região um de seus maiores rebanhos.

De todo modo, a Chapada do Apodi continua sendo o filé do agronegócio no Ceará. É o local preferido para a instalação de grandes corporações do agronegócio. Há terra e água disponíveis - água agora também extraída dos aquíferos Jandaíra e Açu. O agronegócio continua a todo o vapor na Chapada do Apodi, com foco nas monoculturas de frutas, grãos e pastagens.

Para tanto, os incentivos fiscais e financiamentos públicos do Governo do Estado do Ceará são os principais responsáveis por impulsionar esse processo, ao passo da liberação de licenças ambientais e outorgas para uso da água, além de demais práticas que contribuem com a territorialização das corporações do agronegócio.

Com isso, ampliam-se também os conflitos, com destaque para aqueles em decorrência de disputas por terra, por água e em razão do uso de agrotóxicos. É nítida a sobreposição de uma territorialidade sobre a outra. Isso ocorre porque as empresas do agronegócio se instalam em comunidades já ocupadas por camponeses, os quais têm outra relação com a terra e com o território, com foco na agroecologia. Há inúmeros estudos que demonstram como o agronegócio tem sido prejudicial à continuidade do modo de produção camponês na Chapada do Apodi.

E para além da expansão do agronegócio, deve-se ter atenção para a instalação de grandes parques solares, não só na Chapada do Apodi, como também em vários outros municípios pelo Ceará. Isso reconfigura as dinâmicas de uso e propriedade da terra, ampliando, sobremodo, o desmatamento e a concentração fundiária. Há pelo menos dois desses grandes parques de energia solar na Chapada do Apodi, alicerçados em alguns milhares de hectares.

Diante disso, deve-se entender que a Chapada do Apodi, em particular, continua despertando a atenção de grandes empreendimentos capitalistas, que buscam a todo custo se apropriar da terra, da água e do território para ampliarem seus rendimentos. A expectativa é que continuaremos observando o incremento da área plantada com monoculturas nessa porção do Ceará. E com isso, também um agravamento de conflitos de distintas naturezas.

Face à expansão do agronegócio, não há motivos para comemorar.

*Leandro Cavalcante é geógrafo e professor da UFRN.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

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Edição: Lívio Pereira