Estamos em ano de eleição e em breve as campanhas eleitorais também terão início. Mas o que os eleitores precisam ficar atentos em relação a possíveis violações por parte dos candidatos e dos próprios eleitores em relação a legislação eleitoral. O Brasil de Fato conversou com Caio Guimarães, Secretário de Eleições, Atendimento ao Eleitor e Cidadania do TRE-CE para trazer mais informações sobre o tema. Confira
O que pode ser considerado crime eleitoral?
Bom, em relação aos crimes eleitorais, nós temos uma quantidade até razoável no Código Eleitoral de situações que podem ser consideradas crimes, mas a gente tem, lógico, aqueles crimes eleitorais mais comuns, os que de fato tem uma possibilidade maior de acontecer. O principal é a compra de votos, oficialmente corrupção eleitoral, que é você oferecer dinheiro ou oferecer algum bem, alguma troca de valores ou de vantagem para algum eleitor em troca do voto. Oferece um cargo, oferece dinheiro, oferece pagamento de uma conta da moto que está atrasada, do IPVA, então todos esses são formas de tentar comprar à vontade do eleitor. É um dos crimes mais graves e pode levar a prisão além de pagamento de multa.
E ainda dentro do processo eleitoral, pegando o que nós temos agora de mais relevante, existe o crime de fake news, de espalhar a desinformação, espalhar notícias falsas dentro do processo eleitoral. Também é um crime que tem uma pena dentre as maiores e pode levar, inclusive, à prisão de fato da pessoa que replica desinformação no processo eleitoral.
Ainda dentro do processo eleitoral, nós temos aqueles três crimes que são contra a honra, que nós temos no processo penal comum, mas eles têm o crime específico de processo eleitoral, que é calúnia, injúria e difamação. Todos os três eleitorais. E além disso, a gente tem, no dia da eleição, dois crimes clássicos, digamos assim, no processo eleitoral. O primeiro deles é fazer propaganda no dia da eleição, que é “a boca de urna”. No dia da eleição a pessoa tem que ir para computar o seu voto. "Eu me dirijo à seção eleitoral, vou lá na urna, pego a filinha, se eu quiser manifestar minha vontade, eu posso ir com a minha camisa, com a minha foto do candidato, eu posso ir com a minha bandeirinha, eu posso colar o adesivo da minha camisa, botar o meu boné", mas eu não posso cutucar a pessoa do lado e dizer: “ei, você tem candidato? Olha, esse cara é muito bom”. Por que não posso fazer isso? Porque isso aí é “boca de urna”, fazer propaganda eleitoral no dia da eleição. Digamos que é o nosso principal crime do processo eleitoral no dia da eleição.
E o outro crime é o transporte irregular de eleitores. Digamos, você tem um distrito em alguma localidade no interior do Ceará e um determinado candidato paga para que uma condução leve alguns eleitores de uma localidade para o local de votação em troca do voto. Isso aí é o transporte irregular de eleitor, que também é um crime grave que, salvo engano, pode pegar até oito anos de prisão, de reclusão.
Então esses eu poderia dizer que são os principais crimes eleitorais que observam uma repetição maior no processo eleitoral.
Você trouxe alguns exemplos de crimes eleitorais entre tantos outros. Esses que você trouxe, por exemplo, podem resultar em prisão para quem infringir essas leis?
Sim. Crimes como, por exemplo, corrupção eleitoral, transporte irregular de eleitor são penas que o quantitativo delas leva a uma condenação, lógico, tem aqueles fatores de réu primário, bons antecedentes, colaboração com a justiça eleitoral, que podem resultar numa substituição da pena, por uma pena não restritiva de liberdade, mas sim de direitos, mas, dentro do quantum padrão ela leva sim a que a pessoa seja encarcerada. É diferente, por exemplo, do crime de boca de urna. O crime de boca de urna, pelo quantitativo de dias que a pessoa pode ficar presa, de meses, ele é convertido em um TCO, uma transação penal. Então, se a pessoa fez uma boca de urna, por exemplo, no domingo da eleição, ela vai ser conduzida à delegacia, assinar um termo de transação eleitoral, TCO, e aí ela vai depois comparecer a uma audiência e aí, possivelmente, o Ministério Público vai propor que aquela pessoa preste serviço à comunidade, pague cestas básicas, por exemplo, que aí são crimes chamados de menor potencial ofensivo, mas o crime, por exemplo, como corrupção eleitoral, transporte irregular de eleitor, esses crimes levam para o encarceramento. São crimes realmente mais graves, principalmente porque muitas vezes aquela pessoa não cometeu só o crime de compra de votos, ela cometeu outras atitudes que vão somar com aquele crime, e aí, naquele somatório de penas, ele chega em um que, felizmente ou infelizmente dependente de quem observe, ele vai ter que ser encarcerado.
Estamos a poucos meses das eleições e a dúvida é: o que os eleitores precisam ficar atentos em relação a irregularidades por parte dos candidatos nesse período de campanha eleitoral?
Bom, o primeiro ponto é uma questão, inclusive, de participação política, de educação política. Observar nos pré-candidatos e quando eles se registrarem até o dia 15 de agosto, que é o prazo final para eles se registrarem candidatos, a partir daí eles viram candidatos de fato, mas observar a história daquela pessoa. Se ele já é gestor público, já é prefeito, já é vereador e que se candidatar à reeleição observem as promessas realizadas em 2020, algumas dessas promessas foram realizadas? Ele pelo menos tentou? Valeu a pena o voto direcionado aquela pessoa, ou será que é melhor mudar, se não, observar também a idoneidade dessa pessoa.
E em relação aos próprios eleitores? O que eles podem e o que não podem fazer até o dia das eleições?
Bom, nós temos procedimentos de propaganda eleitoral irregular. Na propaganda eleitoral irregular não há obrigação de que essa irregularidade seja só do político, do candidato, por exemplo, não se pode realizar propaganda eleitoral em veículos que não seja um adesivo de meio metro quadrado. Então, se o Caio quer fazer um apoio ao candidato dele, eu posso pegar um adesivo de meio metro quadrado e colar na minha porta, aí do outro lado do meu carro coloco um outro adesivo meio metro quadrado, coloco outro na traseira e um na tampa do motor, por exemplo, em cada face do veículo, digamos assim. Aí vamos dizer que o Caio diz assim: “quer saber, rapaz, eu vou mandar adesivar o meu carro inteiro, meu carro vai ser quase um carro madrinha daquele político”, isso é uma irregularidade. Você não pode fazer esse tipo de propaganda eleitoral no veículo e quem vai pagar a multa é o eleitor, é aquela pessoa que fez apoio irregular.
Fazer um outdoor, por exemplo, “eu mandei, eu paguei um outdoor do meu bolso, para poder colocar meu apoio para o político”. Nós já fizemos isso. Você deve lembrar, nas eleições passadas, a comunidade tinha um outdoor, por exemplo, de apoio ao Bolsonaro, que eram feitas na entrada: “essa cidade está com Bolsonaro”, alguma coisa assim. Isso aí é uma irregularidade e a multa foi endereçada a quem mandou fazer. Se eram pessoas físicas, eleitores, esses eleitores foram apenados.
É interessante que os eleitores, aí eu poderia dizer também como uma forma muito bacana deles acompanharem as redes sociais do TRE Ceará. Elas comumente colocam o “proibido permitido”. E aí, se os eleitores quiserem acompanhar as redes sociais do TRE Ceará e a nossa própria página na internet: www.tre-ce.jus.br, lá tem o folder do “permitido e proibido”, então ele vai saber quais formas de propaganda são corretas e quais formas de propaganda são incorretas. Está na dúvida, meu amigo, vá no cartório eleitoral.
Mudou alguma coisa na legislação eleitoral das eleições passadas para essa?
Bom, nós tivemos alguns aprimoramentos na propaganda geral relativa, por exemplo, a comitê de campanha. Agora, dentro do comitê, parte interna do comitê, não existe mais a obrigação de não se ter o efeito outdoor, ou seja, dentro do comitê o candidato pode colocar lá um paredão cheio de fotos, enfim, mas externo continua a questão do efeito outdoor, tamanho máximo de 4 m².
Por exemplo, não pode mais, coisa bem interessante, tocar aqueles jingles de campanha, que tocam no carro de som que sejam configurados com direito autoral, por exemplo, até o caso aí que a Marisa Monte chamou a atenção para a situação, você pega uma música da Marisa Monte e transforma em um jingle eleitoral. Isso não pode. É uma novidade para 2024. Outra novidade também que o eleitor pode até estranhar e com isso fazer uma denúncia ou imaginar que está diante de algo irregular. Os candidatos podem contratar artistas para poder arrecadar fundos para a sua campanha. Então em uma cidade, como Jardim, por exemplo, um determinado candidato a prefeito contratou o Gusttavo Lima para fazer um show fechado, em um clube, e aí o Gusttavo Lima vai cantar nesse clube fechado. Os ingressos são direcionados para as pessoas que pagarem o ingresso para poder, com aquele dinheiro, arrecadar recursos para aquele candidato a prefeito. Aquele evento é para o prefeito arrecadar fundos. E aí naquele evento fechado, o cantor vai lá, vai fazer um show com aquelas pessoas, o candidato pode comparecer, pode subir no palco, os dois podem se abraçar, cantar juntos, isso não é “showmício”, tá? Que muita gente confunde. O “showmício” é quando você tem um comício aberto a todo mundo, de graça e de repente sobe no palco o Gusttavo Lima e aquele comício virou um show. Isso sim é irregular. Então, para 2024, pode ter esse evento de arrecadação de campanha privado, fechado e nele o candidato pode, inclusive, participar junto com o artista contratado.
E, lógico, também as modificações de internet. Neste ano, o uso de inteligência artificial deve ser rotulado, no caso, por exemplo, para deixar um caso bem prático, um determinado político, há algumas semanas atrás, acho que em Tocantins, fez um evento de pré-campanha, ele não tinha muito apoiador, o evento dele não foi muito bacana, só deu ali umas dez pessoas, então não ficou muito bonito a filmagem, aí ele pegou a inteligência artificial e usou para aumentar a quantidade de pessoas para aquele comício de pré-campanha ficar lotado, ele inseriu ali pessoas virtuais, então a Justiça Eleitoral determinou a retirada daquela propaganda por ser irregular, e a imposição de multa, porque ele utilizou inteligência artificial para fazer, para incrementar uma propaganda eleitoral.
E finalizando, a questão do deepfake. Eu não posso pegar a voz do Francisco Barbosa, gravar a voz dele que está no rádio e aí usar, por exemplo, para um fim ilícito.
E todas essas informações a gente pode pegar no site, nas redes sociais do TRE-CE?
Exatamente. Por isso que é interessante acompanhar principalmente o Instagram do TRE Ceará e o próprio site do TRE, tanto ele tem a parte de mentira, desinformação, que é o “fato ou boato”, quanto ele tem as cartilhas de propaganda eleitoral e em breve o aplicativo Pardal, que qualquer eleitor pode baixar no celular Android ou da Apple, e aí no Pardal, de onde você estiver você filma aquela irregularidade, você tira foto e você manda e já vai direto para a equipe de fiscalização da sua cidade.
Algumas eleições passadas nós vimos denúncias feita por colaboradores, funcionários, de empresários que exigiam que seus colaboradores votassem em determinados candidatos. Como é que os eleitores podem se proteger desse tipo ação?
Nesse caso, o assédio eleitoral, esse assédio utilizado nas empresas, ele configura até uma ação mais grave do que a propaganda irregular, que é o chamado abuso de poder. Você pode fazer o abuso de poder econômico, que é quando você usa aquele poderio econômico que você tem, porque você é dono da empresa e os funcionários dependem daquele emprego, como também você pode fazer, que acontece muito, você é servidor de uma repartição da prefeitura, por exemplo, e aquele gestor daquela repartição meio que força a barra para que aqueles servidores votem em determinado candidato. E aí, nesse caso, é o abuso de poder político.
Então o abuso de poder económico e abuso de poder político devem ser denunciados diretamente ao Ministério Público, ao promotor de justiça. Então se isso está acontecendo na sua empresa, se isso está acontecendo na sua repartição pública, denuncie junto ao promotor eleitoral, para que isso possa representar, de fato, no afastamento daquele mau gestor.
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Edição: Camila Garcia