Ceará

Luta

Artigo | Greve nas universidades federais em defesa dos professores e da universidade pública

Reposição das perdas inflacionárias e melhoria das condições de trabalho são algumas das pautas apresentadas ao governo.

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
Assembleia Geral no dia 9 de abril que deflagrou a greve docente das universidades federais do Ceará - UFC, UFCA e UNILAB. - Nah Jereissati / ADUFC

A categoria de docentes das Universidades Federais do Estado do Ceará (UFC, UFCA e UNILAB), representada pela ADUFC, entrou em greve no dia 15/04, em articulação com docentes de outras seções sindicais do ANDES-Sindicato Nacional. Depois de mais de nove meses de negociações com o governo federal, ainda não obtivemos respostas minimamente satisfatórias às nossas reivindicações. Entre as principais pautas que apresentamos ao governo, estão a reposição das perdas inflacionárias, a equiparação de benefícios com outras carreiras do serviço público federal, a reestruturação da carreira docente, a recomposição e a ampliação dos orçamentos das universidades públicas, além da melhoria das condições de trabalho.

As mesas de negociação com os servidores públicos federais ocorreram durante o segundo semestre de 2023 e entraram pelo ano de 2024, sem grandes avanços. Depois de anos de defasagem salarial, aprofundada nos governos Temer e Bolsonaro, os docentes federais colocaram na mesa de negociação um índice para recomposição de seus salários. O governo federal, entretanto, demorou a dar uma resposta concreta e, no apagar das luzes do ano legislativo de 2023, fez uma proposta inaceitável: nenhum reajuste em 2024 e 9% divididos em 2025 e 2026. Essa proposta não só não recupera perdas passadas como impõe novas perdas aos trabalhadores do serviço público. Os servidores a rejeitaram e elaboraram uma nova proposta, com índice menor, dando sequência ao processo de negociação. Nas duas mesas seguintes, o governo recolocou sua proposta inaceitável. A imprensa noticiou a fala do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que o orçamento estaria “fechado” e que não haveria mais espaço para reajuste salarial dos servidores públicos federais em 2024. Além disso, as outras pautas quase não foram tratadas.

Diante da afirmação de Haddad, algumas perguntas surgem: qual a prioridade dada por governo e Congresso Nacional aos trabalhadores do serviço público? Estes ficam por último no orçamento e, se não couberem lá, ficam de fora? Ou a intenção é mesmo reduzir salários por meio da inflação? É defensável o congresso exigir valores bilionários em emendas parlamentares e o governo “fechar o orçamento” desvalorizando as carreiras da Educação, que é fator de perda de qualidade numa área vital para o país?

Note-se que não estamos falando aqui em aumento real de salário, mas apenas de reposição de inflação. A proposta do governo de reajuste apenas de benefícios em 2024 não contempla nossas reivindicações porque deixa de fora os aposentados, já bastante sacrificados pela perda de direitos e pelas constantes manobras neoliberais para abocanhar parte de suas aposentadorias.

Os orçamentos das universidades federais também estão ainda em patamares incompatíveis com a necessidade de reconstrução após o período desastroso de Temer e Bolsonaro. É urgente recuperar a infraestrutura das universidades e as condições de trabalho dos professores em ensino, pesquisa e extensão. As universidades públicas e as comunidades universitárias têm demonstrado uma enorme resiliência, mas há um limite para que a precariedade não atinja o modelo de universidade pública que conquistamos: uma universidade gratuita e de qualidade, que forma em alto nível, produz pesquisa de excelência e, ao mesmo tempo, inclui e se democratiza.

Desde a aprovação do primeiro teto de gastos que os orçamentos dos serviços públicos caem. Mesmo no governo Lula, que expressa vontade de garantir direitos, os orçamentos de instituições e políticas públicas não conseguem se expandir segundo as necessidades sociais. Em vista disso, consideramos que essas regras fiscais são contrárias ao interesse público e constituem ameaças à democracia, uma vez que a negação sistemática de direitos leva à descrença nos valores da cidadania e à corrosão das relações democráticas.

Por fim, gostaria de destacar que as reivindicações que nos levaram à greve – salários, carreira, orçamento e condições de trabalho – não são apenas pautas corporativas, mas uma luta mais ampla, em defesa das instituições públicas de ensino superior e da qualidade da educação e da pesquisa públicas. Não é uma luta apenas dos docentes, portanto, mas de interesse geral. Em vista disso, esperamos contar com a solidariedade e o apoio de todos para chegarmos a uma vitória que será de toda a classe trabalhadora.

*Professora da UFC e presidenta da ADUFC.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

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Edição: Camila Garcia