Artista de Barbalha narra o cotidiano de violência ao qual jovens negros são submetidos no Brasil
ANTES DE COMEÇAR A LER, FIQUE CIENTE, CONTÉM SPOILER!
Retomando a conversa semanal aqui com vocês, gostaria de sugerir uma história em quadrinhos que conheci por intermédio de minha companheira, 9mm de distância do artista Paulo Bruno. A HQ foi editada e publicada pela Conrad Editora de São Paulo.
A história muito bem escrita textual e imageticamente por Paulo narra a história de Gabriel, ou melhor, narra como o estado de violência com a qual convivem cotidianamente a classe trabalhadora, que é majoritariamente negra, nos bairros periféricos por todo o Brasil encerra a vida de um jovem cheio de sonhos.
Na primeira página já temos uma cena de tiroteio, onde Gabriel que estava em um encontro com uma garota, quem sabe a sua futura companheira, quem sabe a mulher com quem ele construiria família, realizaria sonhos… Não temos como saber, pois uma bala perdida(?) de um tiroteio iniciado pela polícia racista, violenta e despreparada o acertou e lhe arrancou todos os sonhos.
Não esqueçamos, essa polícia criada na ditadura militar e com herança colonial segue sendo a mesma até os dias atuais, por isso todos nós temos que questioná-la e cobrar mudanças. As câmeras no fardamento é um começo, mas temos que lutar pela desmilitarização da polícia e por um treinamento humanizado do profissionais. Algo precisa ser feito.
Mas voltando a HQ, é interessante a forma como Paulo Bruno desenvolve a narrativa. Podemos pensar nas camadas de histórias que estão sendo contadas, é a história de Gabriel, mas também de sua família – mãe, pai e irmão –, é a história da garota com quem ele estava na hora do seu assassinato que nunca mais será a mesma depois do que viveu ali, é a história de uma sociedade adoecida.
Paulo consegue construir uma história que tem lado, que problematiza a realidade, podemos até dizer que ele militou nessa história, como dizemos muitas vezes, mas ele fez isso de forma muito potente artisticamente, sem ser panfletário. Uma narrativa que mesmo curta, são apenas 32 páginas, consegue dar uma boa profundidade e complexidade a cada personagem que aparece. É de certa forma uma homenagem a sujeitos reais, como Ágatha Felix e João Pedro, construção de memória para que nunca se esqueça, para que nunca mais aconteça.
Conheça mais sobre esse grande artista cearense, acesse o seu Instagram @paulobruno_art e compre suas histórias. Essa HQ eu comprei por menos de R$ 10, uma cerveja ou uma carteira de cigarro a menos no mês e você fortalece o trabalho de um artista que tem muita coisa interessante para dizer.
O estado capitalista segue dizimando nossos sonhos, mas nós artistas, trabalhadores, nós o povo seguimos construindo o sonho de um mundo melhor.
*Lívio Pereira é trabalhador da cultura e militante social, escreve para o BdF há mais de um ano.
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato. O título foi retirado de um dos versos da canção que encerra o espetáculo.
Para receber nossas matérias diretamente no seu celular clique aqui.
Edição: Francisco Barbosa
Edição: Camila Garcia