Cerca de 27 tipos diferentes de agrotóxicos foram detectados na água consumida pela população de quatro municípios cearenses: Fortaleza, Caucaia, Russas e Ararendá. Além das cidades cearenses, mais de 200 outros municípios brasileiros também tiveram resultados positivos para a presença de substâncias tóxicas presentes na água que abastece parte da população.
De acordo com resultado dos testes realizados ainda em 2022 e divulgados na última segunda-feira (16) pelo Repórter Brasil, a partir do cruzamento com informações do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua), do Ministério da Saúde, cerca de 210 municípios brasileiros estão na lista onde os agrotóxicos foram detectados. A pesquisa revela ainda que o número pode ser bem maior, pois 56% dos municípios brasileiros não enviaram dados ou publicaram informações consideradas inconsistentes pelo Ministério da Saúde.
A jornalista Amanda Sampaio, de 36 anos de idade e moradora de Fortaleza, afirma que visualiza diversos riscos possíveis com a quantidade de agrotóxicos presente na água que abastece toda a população das cidades em que foram detectados. A jornalista afirma ainda que os riscos podem ser diretos e indiretos, pois, mesmo que algumas pessoas não façam o consumo direto da torneira, utilizam a água para preparo de refeições. “Os agrotóxicos têm uma relação direta com questões cancerígenas e até com depressão também. Então, a gente está exposto a curto e a longo prazo a uma série de doenças que podem aparecer cada vez mais cedo por conta da nossa exposição frequente a esses venenos”, afirmou.
Mesmo com o alto número de substâncias encontrados, os testes identificaram que se olhado separadamente, a concentração de cada substância está dentro do limite considerado não-nocivo pelo Ministério da Saúde, ou seja, mesmo presentes na água utilizada para consumo humano, a quantidade de água não é prejudicial para a população, no entanto, fica o alerta para os que consomem de forma considerável a água fornecida pela Companhia de Água e Esgoto do Estado do Ceará, a Cagece. Apesar disso, cabe ainda ressaltar que a regulação brasileira não leva em conta os riscos da interação entre os diferentes tipos de pesticidas.
Procurados pelo Brasil de Fato Ceará, a Cagece informou que “o abastecimento de água nos municípios: Fortaleza, Caucaia, Russas e Ararendá, não oferece nenhum risco para a população, visto que os parâmetros estão dentro dos padrões de potabilidade de água estabelecidas na Portaria de Consolidação nº5 do Ministério da Saúde. E o monitoramento obedece rigorosamente às exigências do Ministério da Saúde”. Além disso, quando questionados pelo jornal sobre o funcionamento normal de abastecimento de água nos municípios, sem previsão de quaisquer testes para melhoria da qualidade da água para a população afetada, não obtivemos retorno até o fechamento da matéria.
Dentre os 27 agrotóxicos encontrados na água distribuída nesses quatro municípios cearenses, 15 deles estão associados ao desenvolvimento de doenças crônicas como câncer, disfunções hormonais e reprodutivas.
Falta de regulamentação do Ministério da Saúde
Um dos maiores fatores preocupantes quando nos deparamos com o número de pesticidas detectados na água consumida, é que o Ministério da Saúde não regula a possibilidade de interação entre as diferentes substâncias encontradas, interação essa chamada de "efeito coquetel", e que pode gerar consequências ainda desconhecidas ao organismo humano.
A jornalista expõe que ainda considera muito fraca a regulação feita pelo Ministério da Saúde em relação a quantidade de agrotóxicos presentes em produtos consumidos pelo povo brasileiro. “A gente vê vários agrotóxicos que já são proibidos, por exemplo, na Europa, que continuam a ser usados no Brasil e que, inclusive, tem vários que têm isenção fiscal. Por isso, precisamos que esse processo de regulação e fiscalização, que é fundamental para que a gente possa ter minimamente a saúde da população garantida, seja fortalecida”.
Adriana ainda ressalta que a água não deve ser uma mercadoria, embora seja tratada como um produto que pode ser vendido e precificado. “Ela não deve ser uma mercadoria porque ela é um bem comum e essencial à vida. Eu acho que essa situação pode ser revertida sim, com vontade política. Não faz nenhum sentido a gente comer e tomar veneno”, pontuou.
Enquanto a União Europeia impõe um limite para a presença de diferentes substâncias na água, o risco da mistura é ignorado pela normativa do Ministério da Saúde. A pasta teve a chance de regular essa questão em 2021, quando a nova Portaria de Potabilidade da Água foi aprovada, mas tratou apenas dos limites individuais. Quando questionados pelo Repórter Brasil sobre a falta de regulação, o Ministério afirmou que existe uma grande dificuldade em calcular os efeitos causados pelas diferentes combinações de substâncias químicas na água.
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Edição: Camila Garcia