Todos nós sabemos que o Brasil é um país geograficamente continental, com mais de 210 milhões de pessoas espalhada em vários territórios, se dividindo em cinco grandes regiões, onde a diversidade cultural, conceitualmente, é gigantesca. Mas a ideia aqui não é falar dessa amplitude que, segundo Edward Tylor (1832-1917), "A cultura é todo aquele complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da sociedade”, mas sim, dos espaços e territórios de artes e culturas nesses últimos períodos da luta de classe no Brasil.
Neste ano, em que a Cultura Hip Hop comemora 50 anos, farei uma série de artigos sobre a cultura de resistência, que vem cumprindo um papel central nessa conjuntura. Para nós, do Movimento Brasil Popular, que está organizado em dezenas de estados e capitais, aponta como um dos elementos que justifica a polarização do atual ambiente político à Guerra Hibrida patrocinada pelos EUA, em 2013. Revisando aquele momento, tudo estava contra o governo Dilma, a Copa do Mundo da FIFA foi um exemplo disso, a paixão cultural pelo futebol que sempre unificou o país daquela vez dividiu com a derrota da seleção brasileira para a Alemanha por 7 a 1 na semifinal, em Belo Horizonte (MG), dois dias depois da largada oficial das campanhas eleitorais, amplificando a disputa ideológica.
A partir daí as três dimensões da luta de classe se aguçaram em um ritmo acelerado, tanto pelos inimigos do povo, como também pelas forças populares. Naquela eleição o país ficou nitidamente divido, menos a cultura de resistência, em especial o Hip Hop. Grande parte da cultura popular e alguns famosos, mesmo com as críticas, apoiaram massivamente o PT, lançando um manifesto que concluía com essas palavras: “O caminho iniciado por Lula e continuado por Dilma é o da primavera de todos os brasileiros. Por isso apoiamos Dilma Rousseff”, e assinavam: Gregório Duvivier, Camila Pitanga, Osmar Prado, Paulo Betti e Matheus Nachtergaele (atores), Emicida, Ellen Oléria, GOG, Chico Buarque, Chico Cesar, Beth Carvalho e Zezé Motta (músicos), Fernando Morais e Luís Fernando Veríssimo (escritores), o cartunista Ziraldo além de outros intelectuais e jornalistas. Puxado pela luta institucional, combinada com as lutas de massas e ideológicas chegamos a eleger a presidenta Dilma no 2° turno, em 2014, com 51,64% dos votos válidos, ou seja, 54,4 milhões de votos.
Na outra mão, alguns agentes que fazem parte da cena cultural, em especial do Mainstream, financiada pelo agronegócio e a Rede Globo, apoiaram o golpista do Aécio Neves do PSDB (que teve 48,36% dos votos válidos e teve pouco mais de 51 milhões de votos), entre eles estavam os apresentadores: Luciano Huck e Danilo Gentili, os esportistas: Ronaldo Fenômeno, Junior Cigano (lutador de MMA), Oscar Schmidt, Zico e outros. Os músicos: Banda Jota Quest, Sandra de Sá, Wanessa e Zezé Di Camargo, Fagner, Fafá de Belém, Chitãozinho e Xororó, Eduardo Costa, Bruno e Marrone e outros. Os atores: Ney Latorraca, Marcelo Cerrado, Lima Duarte, Tom Cavalcante e Marcelo Madureira (humorista), entre outros.
Esse resgaste histórico é para mostrar que a cultura já era um elemento chave na luta de classe e foi usada exaustivamente na disputa ideológica, tanto na consolidação do golpe como também na resistência popular, entrincheirada na defesa da democracia e de um governo legitimamente eleito pela soberania popular através do voto. O Hip Hop se manteve coeso, crítico, responsável e unido, sendo o único segmento cultural a protestar abertamente contra o golpe e lançar uma carta de apoio ao Governo Dilma.
Os dois anos seguintes, o sabor amargo de uma derrota institucional via impeachment azedava o paladar, as forças populares jogaram peso e centralidade na luta de massas, atos de rua, manifestações e greves foram organizadas mês a mês com participação de vários artistas em todo país, já que o inimigo vinha ocupando essa dimensão também, avançando e acumulando vitórias no campo institucional e ideológico. O golpe (de um novo tipo) jurídico-midiático-parlamentar foi violento, destrutivo e inevitável. Só a cultura seria capaz de resistir, furar a bolha e informar as massas. A cultura de rua seria a locomotiva que levaria luz a escuridão de forma poética como as sonoras palavras da presidenta: “O golpe é contra o povo e contra a Nação. O golpe é misógino. O golpe é homofóbico. O golpe é racista. É a imposição da cultura da intolerância, do preconceito, da violência”.
Couberam aos artistas e militantes da cultura de resistência à árdua tarefa de organizar um levante popular contra o fascismo, assim se iniciou a reação organizada, mobilização permanente, a defesa ativa foi parida e a cultura se tornou vital para a luta, para a libertação do Lula, para a derrota do Bolsonaro e a reconstrução da democracia e do país. O Hip Hop segue em marcha.
*Assistente Social, militante do Movimento Brasil Popular e Defensor dos Direitos Humanos e da Paz na Periferia.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
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Edição: Francisco Barbosa