A mídia comercial sempre atuou descaradamente em favor dos partidos adversários do PT.
Após mais de um ano de ausência, devido a responsabilidades da paternidade recente e a luta para concluir a tese de doutorado, retomo, com muito entusiasmo, minha coluna no Jornal Brasil de Fato Ceará. O contexto que estamos, graças à Deus, é bem diferente daquele em que escrevi o último artigo, no final de 2021. Conseguimos derrotar Bolsonaro nas urnas após uma duríssima batalha eleitoral e estamos num esforço de reconstrução do Brasil, com todas as contradições e dificuldades intrínsecas a este processo. Muita coisa aconteceu desde a subida épica de Lula na rampa do Planalto, nem parecendo que se passaram apenas quatro meses do novo governo.
Nesse tempo algo parece que não mudou e continua a se retroalimentar cotidianamente, o antipetismo entranhado nas redações do jornalismo brasileiro. Desde que o Partido dos Trabalhadores surgiu nos anos 1980, sabemos que os alguns veículos de comunicação, em especial a Rede Globo, declararam o partido como um inimigo a ser batido. Mesmo com as mudanças programáticas que o PT foi assumindo ao longo de mais de quarenta anos, a mídia hegemônica continua implacável na sua sanha antipetista. Olhando no retrovisor, basta uma rápida pesquisa sobre a cobertura das candidaturas petistas à presidência nos principais jornais do país para ratificarmos nossa afirmação. Sejam nas derrotas em 1989, 1994 e 1998 ou nas campanhas vitoriosas de 2002, 2006, 2010 e 2014, a mídia comercial sempre atuou descaradamente em favor dos partidos adversários do PT.
Mesmo durante os governos de Lula e Dilma, a imprensa corporativa agiu como uma fiel opositora. Foi assim na chamada crise do mensalão em 2005, na operação Lava Jato a partir de 2014 e na posição assumida durante o golpe de 2016. Mesmo nas eleições de 2018, a maior parte dos meios de comunicação foi cúmplice do fortalecimento da extrema direita e da vitória de Bolsonaro. Na minha avaliação, o antipetismo atual é alicerçado e reproduzido a partir de três elementos principais. Vejamos:
O primeiro é o velho preconceito de classe presente no nosso jornalismo. A relação histórica do PT com os movimentos e demandas populares, desde a redemocratização, sempre foi alvo de críticas contundentes. Relação que perdura até hoje com parte expressiva do sindicalismo, dos movimentos negro, camponês, estudantil, de mulheres e LGBTQIA+, que para a visão liberal representa um perigo. Inclusive, há hoje várias tentativas de apropriação de pautas e bandeiras desses movimentos por parte da imprensa burguesa com o intuito de amenizar o caráter combativo e político dessas lutas, tentando enquadrá-las como meras pautas de “costumes” ou filantropia. A própria figura de Lula, sua origem popular, o sucesso dos governos anteriores e seu prestígio internacional são intragáveis para tais veículos de comunicação.
O segundo são as falsas simetrias estabelecidas em comparações ordinárias, a exemplo da ideia de polarização entre lulismo e bolsonarismo, como fossem campos extremos da cena política contemporânea. Lula nem de longe possui posições extremistas, muito pelo contrário, desde seu primeiro governo estabeleceu uma ampla política de alianças, inclusive com setores hoje vinculados ao movimento bolsonarista, como o agronegócio. A própria equiparação entre os atos golpistas de 8 de janeiro com ações recentes do MST, revelam a desfaçatez e covardia desse argumento.
O terceiro está vinculado ao projeto econômico que a mídia comercial apoia desde os anos 1990. Qualquer sinal de tensionamento com os dogmas neoliberais é prontamente afrontado pelos porta vozes do jornalismo empresarial. Basta lembrarmos das falácias contrárias à PEC da Transição, ainda no final do ano passado, na defesa intransigente da política criminosa de juros do Banco Central e do próprio debate sobre o novo marco fiscal. As posições que assistimos nas mesas de debate e nas análises “especializadas” são praticamente unânimes e apenas ressoam os interesses do mercado financeiro, tentando enquadrar concessões sociais sugeridas pelo governo, ou a inclusão do pobre no orçamento, como insiste Lula, como irresponsabilidade fiscal.
A aversão ao Partido dos Trabalhadores alimentado pela mídia comercial ao longo de anos tem sido um dos propulsores para o crescimento de grupos, veículos e lideranças, que de forma cínica, têm disputado e incidindo sobre a opinião pública a partir de pautas obscurantistas e valores reacionários, como o armamentismo, a LGBTfobia, o racismo, a misoginia, a intolerância religiosa e na destruição do Estado de direito. A despeito de críticas e conflitos com o governo anterior, parecem ter a memória curta e não recordam o que foi a barbárie dos anos Bolsonaro. Além do mais, a extrema direita continua ativa nas ruas, nas redes e na política institucional. A mídia comercial está mesmo comprometida com a defesa da democracia ou continuará, escrava do antipetismo, jogando água no moinho do neofascismo brasileiro?
*Pedro Silva é Cientista Social, professor da UECE e militante do Movimento Brasil Popular.
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
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Edição: Francisco Barbosa