O Ministério Público do Ceará (MPCE) deu prazo até esta sexta-feira (10) para a Prefeitura de Fortaleza resolver os problemas apontados no relatório entregue pela Mandata Nossa Cara (Psol), sobre as pousadas sociais que atendem cidadãos em situação de rua em Fortaleza. As denúncias foram apresentadas na Câmara Municipal de Fortaleza na última semana e entregues ao MPCE pela co-vereadora da Mandata, Adriana Gerônimo. As denúncias se somam ao alerta feito pelo BDF sobre a piora de vida das pessoas em situação de rua durante a quadra chuvosa.
De acordo com a promotora Giovana de Melo, o MPCE exigiu adoção de medidas, em caráter de urgência, como a troca imediata dos colchões, a dedetização dos equipamentos e os reparos nos banheiros e demais lugares insalubres. “O MP vai fazer uma nova visita para averiguar as medidas e adotar um cronograma de visitas em todos os equipamentos para que as fiscalizações sejam realizadas de forma periódica e, assim, garantir que o município mantenha a qualidade e eficiência do serviço prestado”, explicou a promotora, que também determinou visita do Conselho de Segurança Alimentar para averiguar o acondicionamento e manipulação dos alimentos oferecidos nos equipamentos.
De acordo com a Prefeitura de Fortaleza, cada pousada tem capacidade para atender 100 pessoas por dia, garantindo acomodações seguras em condições dignas de acolhida, alimentação, bem como espaços adequados para a realização de necessidades básicas de higiene pessoal e sanitária. Mas as denúncias feitas por usuários e confirmadas pela Mandata Nossa Cara trazem uma realidade diferente.
Representando a Mandata, a co-vereadora Adriana Gerônimo visitou os equipamentos da Prefeitura de Fortaleza e apresentou na tribuna da Câmara o relatório emitido em conjunto por representantes do Comitê Estadual de Políticas Públicas para a População em Situação de Rua (CEPOP), do Comitê Intersetorial de Atendimento à Pessoa em situação de rua (COMPOP), da Pastoral do Povo da Rua da Arquidiocese de Fortaleza e do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR).
De acordo com o documento, nos dois equipamentos os problemas são semelhantes. Há menos colchões do que camas e muitos deles estão rasgados, com infestação de fungos e parasitas. O lugar é insalubre, com pouca ventilação de ar, mal cheiro e sem saída de emergência. Na pousada da avenida Dom Manuel, um dos funcionários disse que a entrega de itens de higiene pessoal está sendo racionada, pois há poucos kits com escova de dente, sabonete e barbeador. Nos banheiros há infiltrações, vazamentos, sanitários sem descarga e pias quebradas. Na parte de baixo existem dois compartimentos pequenos para a administração e logo em seguida do lado esquerdo, banheiros improvisados e uma tentativa de banheiro acessível. Na pousada da Avenida Imperador, o equipamento está há 4 meses sem receber repasses da Prefeitura para compras de materiais de limpeza.
As denúncias também ressaltam que os educadores sociais e vigilantes que trabalham no equipamento precisam de adicional de insalubridade aos salários, já que os profissionais têm contato direto com pessoas que vivem em situação de rua e algumas delas têm doenças relativas ao modo precário de vida, como tuberculose e outras doenças contagiosas.
Na tribuna da Câmara, a co-vereadora Adriana Gerônimo relatou que a primeira dificuldade foi a de entrar no equipamento da Avenida Dom Manuel. A parlamentar lembrou que seu papel como vereadora é fiscalizar e melhorar os serviços públicos e pediu providências à Prefeitura e ao Ministério Público para modificar o cenário desolador encontrado nas pousadas.
"Quais são as vidas que nos comovem? Aquelas pessoas têm um tratamento desumano. A gente mexia nos colchões e os bichos fervilhavam dentro e as pessoas com o corpo coberto de feridas. Encontramos um lugar que abriga pessoas em situação de rua, sem zeladoria, sem ter alguém pra limpar os quartos e os banheiros. A gente andava pelas pousadas com os percevejos comendo nossos pés. Uma pousada social gerida por uma organização social que está há meses sem receber recursos, nem para comprar sabão em pó", relatou a vereadora.
Em nota, a Prefeitura de Fortaleza, por meio da Secretaria de Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SDHDS), informou que efetuou todos os repasses devidos à instituição gestora no ano de 2022, e que um aporte adicional de recursos está sendo negociado com vistas ao atendimento da crescente demanda. Além disso, disse que a pasta vem realizando ações para o melhoramento contínuo dos serviços prestados nas Pousadas Sociais. Sobre a reforma dos equipamentos, a SDHDS disse que estão sendo realizadas vistorias técnicas pela equipe de infraestrutura antes das obras. A revitalização dos banheiros foi iniciada com pintura, troca de pias e maçanetas.
No que se refere a aquisição de mobiliário e colchões, a Prefeitura disse que as homologações das licitações foram iniciadas ainda em novembro de 2022 e que até que seja finalizada a licitação e a troca definitiva por colchões novos será feita a substituição temporária com 140 colchões cedidos pela Defesa Civil. Sobre a quantidade de percevejos, a Prefeitura informou que a última desinsetização foi realizada no final de janeiro.
Ministério Público
As condições dos equipamentos sociais oferecidos pela Prefeitura de Fortaleza à população em situação de rua levaram o Ministério Público do Ceará a recomendar a interdição da Casa de Passagem Elisabete de Almeida Lopes, localizada no Benfica. O MPCE ajuizou a Ação Civil Pública, pois o equipamento encontra-se em situação indigna para habitação, não oferecendo o mínimo de proteção e segurança aos abrigados e em desobediência às normas que regem o regular funcionamento da atividade.
Em visita realizada pela 1ª Promotoria de Justiça da Pessoa Idosa, promotores encontraram o equipamento em situação precária, sem documentos públicos e arquivos institucionais comuns ao equipamento socioassistencial. De acordo com o MPCE, há ainda problemas nos aspectos de limpeza, organização, salubridade, acessibilidade, segurança, recursos humanos, alimentação e outras garantias mínimas aos abrigados. Ao tempo da visita, a instituição contava com 11 pessoas idosas residentes.
É dever do MP acompanhar as políticas públicas, monitorando as iniciativas ou recomendando que sejam realizadas pelo poder público. A promotora Giovana explica que o último censo realizado com a população em situação de rua, em 2021, foi uma recomendação do MPCE. De acordo com os números divulgados pela Prefeitura, a cidade tem 2.653 pessoas que vivem em situação de rua, mas para a promotora esse número já deve estar defasado. “Eu acredito que está subnotificado, tendo em vista que a pandemia contribuiu bastante para o aumento de pessoas nas ruas por conta do impacto no orçamento familiar, “ressaltou.
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Edição: Francisco Barbosa