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Servidores denunciam assédio moral e perseguição na Unilab

Luma Andrade, primeira doutora travesti do Brasil, relata transfobia e desmonte na Universidade

Brasil de Fato, Fortaleza, Ceará |
Em ato público realizado no último dia 12, Luma Andrade, primeira travesti doutora do Brasil, denunciou casos de perseguição e transfobia na Unilab - Divulgação

No mês da visibilidade trans, a primeira doutora travesti do Brasil, a professora universitária Luma Andrade denunciou, em carta pública, uma série de casos de assédio moral, perseguição e transfobia que ela relata sofrer, na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), em Redenção, no interior do Ceará.

De acordo com a professora, os ataques acontecem desde que ela se candidatou ao posto de diretora do Instituto de Humanidades (IH) da Universidade e continuaram depois da sua eleição, resultando no desmonte do Instituto, em virtude das medidas que impedem o pleno funcionamento do órgão. Na denúncia, Luma diz que a gestão anterior do IH se negou a realizar a transição para a nova gestão. Além disso, despachos solicitando técnicos ou servidores não são atendidos e para piorar a situação, a reitoria da Universidade teria removido todos os técnicos administrativos (TAEs) do Instituto para a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PROPPG). 

A professora alega ainda que a falta de servidores está prejudicando o empenho de recursos e consequentemente, os projetos do Instituto de Humanidade, que atende hoje, 1200 universitários. “Eu sou professora desde 98, e mesmo naquela época e até agora, eu nunca havia sofrido nada que impedisse ou desqualificasse o meu trabalho. Estou com duas funcionárias grávidas sobrecarregadas e duas estagiárias para todas as demandas do IH, o maior da Universidade”, explica Luma. 

Ainda segundo a discente, as denúncias são endossadas por toda a diretoria eleita e pelo Conselho de Unidade Acadêmica do Instituto, que apontam a completa precarização do IH, causando prejuízo no serviço administrativo de todos os cursos, docentes e discentes vinculados.  “São ataques que ferem, através de mim, naquilo que pode ser configurado como assédio moral e até mesmo transfobia, as dinâmicas e o funcionamento de um setor institucional universitário que atende aos cursos das Ciências Humanas”, destaca a professora.

A terapeuta ocupacional Karla Florentino é uma das servidoras que alega ter sido removida à revelia, sem que ela ou sua chefia fossem comunicadas do fato. Ela é a única terapeuta ocupacional da instituição e trabalha na divisão de saúde, segurança e qualidade de vida do servidor, mas foi removida para assumir função gratificada na diretoria do IH. “Não é razoável ao interesse público que a única servidora da universidade que exerce função de Terapeuta Ocupacional para todos os campi da Unilab seja removida para assumir cargo na direção do instituto acadêmico. Nosso caso não é o primeiro e não podemos calar diante de qualquer injustiça, retaliação, perseguição, autoritarismo ou arbitrariedades que ocorram na Universidade ou fora dela”, destaca a servidora. 

As servidoras acreditam que a remoção de ofício executada pela Reitoria é uma retaliação política àquelas que atuam como dirigentes sindicais e participaram ativamente da campanha do presidente Lula, nas eleições de 2022. “Nós encampamos lutas em prol de condições dignas de trabalho, respeito, valorização, dignidade e diálogo. Estivemos à frente da mobilização contra a implantação tempestiva do ponto eletrônico no início de novembro. Não há dúvidas: a remoção de ofício perpetrada pela Reitoria é a pura retaliação às lutadoras da universidade”, ressalta Karla.

Em nota enviada ao Brasil de Fato, o reitor da Unilab, Roque do Nascimento, disse que sua gestão “é compromissada com a interculturalidade, a cidadania, o pluralismo, a democracia e a tolerância das sociedades” e que “repudia todo e qualquer ato de discriminação com base em religião, gênero, orientação sexual, raça, etnia ou nacionalidade”. 

No documento, o reitor alega que atendendo às solicitações da gestão do IH, abriu um processo seletivo para a recomposição do Instituto, mas que não houve nenhuma inscrição para concorrer às vagas. Depois do pleito eleitoral, diz a nota do reitor, houve a indicação de remoção de duas servidoras para compor o IH, mas antes mesmo do processo ser analisado, houve a “antecipada manifestação contrária da direção do IH”. O reitor informa ainda que a Superintendência de Gestão de pessoas da Universidade e a Divisão de Dimensionamento e Movimentação de Pessoal está aperfeiçoando os fluxos das remoções no âmbito da Universidade e que a Procuradoria Jurídica da Unilab deu parecer favorável a remoção “alinhando as necessidades da Administração aos recursos humanos disponíveis.”

Relatos de perseguição se tornaram comuns dentro da Unilab. Outra servidora que não quer se identificar perdeu a indicação a um cargo, por se manifestar a favor dos colegas que relatam perseguições ou discordam de decisões da reitoria. Em outra denuncia, servidores relatam um clima de terror e troca de cargos após a derrota de Bolsonaro nas eleições.  O BDF apurou que as denúncias relatadas acima ainda não foram enviadas ao Ministério da Educação, mas o reitor Roque do Nascimento, responde por outras investigações preliminares da corregedoria do MEC, ou seja, o órgão recebeu denúncias envolvendo o nome do reitor, mas ainda precisa avaliar a admissibilidade dos casos.

Em nota, o Sindicato dos Docentes das Universidades Federais do Estado do Ceará (ADUFC – Sindicato) se solidarizou com as servidoras e lamentou o cenário de contínuos ataques às Universidades, com intensas práticas arbitrárias de gestão em diversas partes do país. Disse ainda que embora o Sindicato reconheça a urgência na remoção interna de técnicos para atender a demanda do IH, se faz necessária “o caráter democrático da realização de consulta aos(às) servidores(as) e de suas chefias imediatas, com posterior consentimento, para que seja efetuada”. O Sindicato considera que mesmo que a remoção tenha sido suspensa, “o ato de violência foi cometido e implica outras medidas pelos danos (morais, psicológicos e de saúde) causados tanto às servidoras quanto ao setor que segue sem ter sua solicitação atendida”.Em pleno mês da visibilidade trans, a mobilização lotou o simbólico auditório do Campus da Liberdade da UNILAB, localizado em Redenção, e contou com a participação de autoridades, instituições governamentais e não governamentais de Direitos Humanos.

Unilab

Criada em 2010 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com uma proposta avançada de ensino e uma constante troca cultural, a Unilab vem sofrendo com cortes de recursos, políticas contrárias aos seus princípios e ingerência de gestões conservadoras. As crises se iniciam nos governos dos ex-presidentes Michel Temer e Jair Bolsonaro.

Edição: Camila Garcia