Quando o Deputado Estadual Elmano Freitas foi lançado candidato para disputar o cargo de governador do Ceará, pelo Partido dos Trabalhadores, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) analisou que a vaga aberta na Assembleia Legislativa deveria continuar existindo na luta pelos movimentos sociais, na luta pela reforma agrária, pelo movimento de mulheres e por demais pautas comprometidas com a construção de um projeto popular para o estado e para o país. Foi refletindo sobre essa conjuntura política e social, que surgiu o nome de Manuel Missias Bezerra para ocupar o parlamento estadual.
Pouco mais de dois meses depois, o povo do Ceará elegeu Missias do MST como o primeiro deputado estadual, representante do MST no estado. Foram 44.853 mil votos na primeira eleição em que o MST lançou candidaturas próprias. Foram 15 em todo o Brasil. Ao todo, seis foram eleitos. No Nordeste, 4 candidaturas foram lançadas. Além de Missias, Rosa Amorim foi eleita deputada estadual em Pernambuco. Vânia do MST que disputava para Deputada Federal no Maranhão e Lucinha do MST para a Assembleia da Bahia, não foram eleitas, mas tiveram expressivas votações, respectivamente com 21.761 e 44.554 votos.
“Que esses mandatos sejam a voz para ecoar as denúncias, nossas lutas e conquistas, nossa esperança. Queremos que esses mandatos nos fortaleçam e fortaleçam a esquerda, a esquerda social e o enfrentamento da luta de classes. Nossa primeira tarefa agora é eleger Lula no segundo turno e depois iremos construir o planejamento do mandato do companheiro Missias”, explica Maria de Jesus, da Direção Estadual do MST e assentada da reforma agrária no município de Russas.
Maria de Jesus explica que para a campanha do Missias, o MST Ceará montou cerca de 300 comitês populares nos assentamentos da reforma agrária e nos municípios onde tem o Movimento organizado. “A campanha foi construída de forma coletiva, com agenda propositiva e agitada. Missias chegou a fazer cinco atividades em um dia, fazendo um trabalho de base e de conscientização política. Estamos muito alegres e abraçamos essa conquista como um grande desafio para o Movimento e agora vamos construir o mandato a muitas mãos, como foi a campanha. Nada sobre nós, sem nós”, ressalta De Jesus.
Manuel Missias Bezerra, o Missias do MST, tem 40 anos, é casado com Clarice Rodrigues e pai de dois filhos, Artur e Valentina. Dirigente estadual pelo setor de produção e membro da coordenação nacional do MST, Missias é filho de agricultores. Sua vida se cruza com o Movimento a partir da ocupação da fazenda Serrote, em Crateús, hoje Assentamento Palmares. Sua família era moradora do acampamento e ele estudou na escolinha que funcionava no local, ingressando na militância do MST ainda adolescente. Se formou administrador como uma tarefa política para colaborar com o processo de organização da produção dos assentamentos e acampamentos do estado. Colaborou diretamente com o mandato do agora governador eleito, Elmano Freitas, que parabenizou a vitória do companheiro de luta.
“Nós tivemos um fato histórico nas eleições para deputados. Tenho certeza que Missias vai representar muito bem as famílias assentadas, em defesa da reforma agrária, da agroecologia. Parabéns ao MST, às famílias de agricultores e agricultoras e todos aqueles e aquelas que participaram dessa linda campanha que elegeu Missias, primeiro representante do MST na Assembleia Legislativa do Ceará”, disse o novo governador Elmano Freitas, em vídeo enviado ao BDF.
Tentativa de criminalização
Durante a campanha, Elmano foi alvo de críticas dos adversários Capitão Wagner (União Brasil) e Roberto Cláudio (PDT), por ter advogado a favor dos trabalhadores e trabalhadoras do MST Ceará, ainda no início da sua carreira. Na tentativa de criminalizar o Movimento, as duas campanhas veicularam peças político-partidárias associando o maior produtor de arroz orgânico da América Latina ao crime e a violência, apresentando o MST como uma organização criminosa que invade terras. Entretanto, o Movimento atua há 38 anos defendendo a reforma agrária e realizando ocupações em terras improdutivas, onde o estado indeniza os proprietários e as famílias assentam na área, produzindo alimentos saudáveis para consumo e sobrevivência, por meio da agricultura familiar e da agroecologia.
Na noite de domingo, logo após a apuração, Missias falou aos apoiadores e apoiadoras, no Centro de Formação, Capacitação e Pesquisa Frei Humberto. No discurso, agradeceu a luta de diversos parceiros políticos, mas sobretudo, dos trabalhadores e trabalhadoras sem terra do Ceará. “Eu quero primeiro agradecer a todos os movimentos sindicais, populares, pastorais, dos campos e das cidades, que estiveram lado a lado fazendo essa campanha. Pela primeira vez, um movimento camponês que saiu da lona preta, da fome e da miséria, tem um deputado estadual. Fizemos a primeira parte que garantiu nossa vitória nas urnas, mas esse mandato é coletivo e eu quero pedir de forma muito humilde, que precisamos construir com as mãos de todos, um mandato popular que represente os anseios e as vontades de toda a classe trabalhadora, principalmente de quem mais precisa. Essa é a nossa tarefa e precisamos de cada um e cada uma, junto e misturado nessa luta”, ressaltou o deputado eleito.
Entre as propostas defendidas pelo novo parlamentar, está a criação de cozinhas populares apoiadas financeiramente pelo Estado, garantindo que pelo menos 50% dos insumos e alimentos sejam produzidos pela reforma agrária e agricultura familiar. Missias também defende a isenção do ICMS para produtos advindos das cooperativas, agroindústrias e agricultura familiar. O mandato do MST também lutará pelo Plano Estadual de Adaptação Climática para a agricultura familiar, pelo combate à desertificação e pelo passe livre de duas passagens diárias em transporte público, para que desempregados possam procurar emprego, sem gastar dinheiro com deslocamento.
Missias do MST também quer maior cobertura de tempo integral para as escolas do campo, assim como das cidades; a criação de um projeto estadual de habitação que garanta maior qualidade de vida para famílias de baixa renda e a elaboração do projeto Escola das Economias do Mar para valorizar as comunidades pesqueiras do Ceará. Além disso, pretende desenvolver projetos que contribuam para a proteção às mulheres e a comunidade LGBTQIA + e revitalizar grandes praças públicas com estímulo à organização da juventude, fortalecendo eventos culturais e esportivos desenvolvidos por jovens de cada região. A comunidade artística também será beneficiada diretamente, com o desenvolvimento de um Programa de Apoio Estadual Permanente para os artistas do Ceará.
Edição: Camila Garcia