Ceará

Eleições 2022

Candidaturas coletivas promovem o debate sobre representatividade e direitos das minorias

No Ceará, quatro chapas coletivas concorrem ao legislativo estadual e federal este ano, apenas uma disputou em 2022

Fortaleza, CE |
O Coletivo "Vozes Feministas" que disputa uma vaga na Câmara é formado por cinco mulheres: Ana Vitória, Anna Karina, Damiana Bruno, Mariana Braga e Naiane Araújo. - Divulgação

Apesar de não serem mais uma novidade no Brasil, as candidaturas coletivas são uma opção, cada vez mais viável, para os grupos que representam as chamadas minorias, sobretudo ligados à esquerda. A participação consciente desses coletivos beneficia a democracia, visto que boa parte dessas candidatas e candidatos são ligados a movimentos sociais, organizações populares e sindicais e movimentos LGBTQIA+, garantindo e ampliando espaços políticos para pautas urgentes serem debatidas por quem de fato conhece as questões de perto.  
 
A campanha deste ano vai ser a primeira onde o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) autoriza que a denominação do coletivo apareça na urna eletrônica ao lado do nome do candidato que o representa. Mesmo com o avanço, a resolução aprovada pelo TSE ainda mantém a exigência de que a candidatura seja registrada no nome de apenas uma pessoa, assim como o exercício do mandato. No Ceará, os eleitores contam com quatro opções nesse formato, contra apenas uma formada e eleita em 2020, a Nossa Cara (Psol). Duas delas concorrem para vagas na Assembleia Legislativa e outras duas tentam ocupar as cadeiras da Câmara Federal em 2023, todas ligadas ao Psol. 


'É tem pode aquilombar', com Cristina Quilombola, Maria Suelina da Silva e Sandra Caetano concorrem a uma vaga na Assembleia Legislativa do Ceará. / Divulgação

Disputando a vaga para o legislativo estadual, a candidatura "É tempo de Aquilombar", é formada por Cristina Quilombola, liderança da comunidade Caetanos de Capuan, em Caucaia, e integrante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ); Maria Suelina da Silva, liderança da Serra de Juá (Caucaia); e Sandra Caetano, da comunidade Conceição de Caetano, em Tururu. Como representante da chapa coletiva, Cristina afirma que o grupo “vem nessa missão de afirmação, empoderamento, garra, acolhimento e também de escuta aos nossos povos quilombolas aos povos e comunidades tradicionais e a toda sociedade que acredita no protagonismo de nós mulheres para a garantia de melhorias nas políticas públicas”, ressalta.

Ainda tentam vaga na Assembleia Legislativa, a “Chapa da Classe Trabalhadora”, formada por participantes do movimento Brigadas Populares do Ceará, sendo eles o educador social, Cleyson Almeida, o catador de resíduos sólidos, Cícero Catador, e a cabeleireira, Sarah Bonfim.


Coletivo 'Bora de Ruma' disputa vaga na Câmara Federal. / Divulgação

Pleiteando vaga para Câmara Federal, a candidatura “Bora de Ruma” é formada por três mulheres negras, sendo duas lésbicas e uma Pessoa Com Deficiência. Lídia Rodrigues, Lany Maria e Cristina Costa defendem que o coletivo representa as pessoas que mais sofrem opressão de forma estrutural no Brasil. “Mulher negra, LGBT, PCD, são diariamente oprimidas pelo racismo, capacitismo e machismo. A LGBTfobia mata pessoas por suas orientações sexuais. São lutas que precisam estar unidas para que o enfrentamento seja estruturante. Assim, numa candidatura como a nossa à deputadas federais, todas essas lutas devem estar sinalizadas e como prioridade”, afirma a candidatura. 

Seguindo esse panorama, também na disputa a uma vaga em Brasília, surge o coletivo Vozes Feministas formado por cinco mulheres: Ana Vitória, Anna Karina, Damiana Bruno, Mariana Braga e Naiane Araújo. São três mães, duas negras e uma mulher trans, defendendo a diversidade como principal força para somar perfis importantes na luta contra a opressão nas eleições, como explica a representante da chapa Anna Karinna. “Temos mulheres gigantes no enfrentamento do nosso maior inimigo, que na sua grande maioria, são homens, milionários, querendo tornar a população cada vez mais pobre e atacando cada vez mais nossos direitos, especialmente das mulheres. Agregamos as pautas do feminimo negro, do feminismo trans, da educação e da maternidade. Os coletivos são uma força contra a violência das eleições passadas e eu não via como sair sozinha nesse pleito”, destaca a professora que já disputou vagas para o senado e para a Câmara Municipal de Fortaleza.

O desafio das minorias sociais

Historicamente, grupos minoritários são aqueles excluídos da sociedade, que estão em desvantagem de poder em virtude da sua cor, raça, gênero, orientação sexual e classe social. Nessa perspectiva, a representação política deveria ser capaz de defender essas diferenças, mas é justamente aí que mora a dificuldade. Dados divulgados pelo TSE apontam que dos 991 candidatos no Ceará, 584 se identificam como negros. Outros 394 como brancos, sete são indígenas e três da cor amarelo. 66% dos candidatos são homens e outros 34% são mulheres. Não há registro de candidatos não binários e nem com nome social. O Ceará terá 104 candidatos milionários, o que equivale a 10,5% do total de candidatos. Dos 991 que vão concorrer, 396 declaram não ter nenhum patrimônio.


Juliana Alves, Cacika Irê do povo Jenipapo-Kanindé concorre a vaga de deputada estadual. / Divulgação

A indígena Juliana Alves, que estará nas urnas buscando vaga na Assembleia como Cacika Irê (PCdoB), defende que apenas candidaturas genuínas conseguem falar por seus representados. “Nossa candidatura é uma resposta a todos os retrocessos que os povos tradicionais têm sofrido no campo da política nacional.  Não podemos esperar que outros nos representem e falem por nós.  Nós, especialmente as mulheres indígenas, podemos fazer essas falas para romper os paradigmas. Estamos no chão da Aldeia, mas também no chão da Universidade,  buscando conhecimento e se apropriando da armadura do homem branco para nos defendermos”, ressalta a candidata.  


Sued Carvalho, professora e historiadora é candidata a deputada federal pelo Unidade Popular / Divulgação

Na região do Cariri, Sul do Ceará, a professora Sued Carvalho se engajou nos movimentos sociais de esquerda ainda criança, influenciada pela família. Em 2017, passou a se organizar com o grupo que fundou a Unidade Popular pelo Socialismo (UP), partido pelo qual concorre a uma vaga na Câmara de Deputados. “Enquanto mulher trans, socialista e marxista, no estado brasileiro que mais matou mulheres trans em 2021, sinto que a principal responsabilidade de minha candidatura é conectar a pauta das mulheres trans à dos trabalhadores em geral. É necessário dar caráter de classe às reivindicações das pessoas LGBT e essa é a minha luta. Lutar pela derrota da PEC 95, reforma trabalhista, por mais emprego, por universalização do ensino superior e por conselhos deliberativos com ativa participação popular é lutar pelo direito das mulheres trans.  Nossas pautas específicas só serão efetivadas com nossa união às pautas da classe trabalhadora em geral”, acredita.

A perspectiva é que essas candidaturas promovam um importante debate sobre direitos e representatividade. Nesse sentido, também se destacam na disputa por vagas no legislativo estadual Leo Suricate (Psol), conhecido pelo personagem-influencer “Suricate seboso” e integrante do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto; Missias Bezerra (PT), militante do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra; e as feministas e ativistas dos direitos das mulheres negras, Mariana Lacerda (PT) e Zuleide Queiroz (Psol). Defendendo o direito a moradia, a vereadora pela Mandata Nossa Cara, Adriana Gerônimo, também disputa uma vaga como deputada estadual, assim como a vereadora Larissa Gaspar que abraça bandeiras feministas e de direitos humanos.

Já a pauta da defesa do meio ambiente tem sido visibilizada pelos candidatos a deputados federais João Alfredo (Psol), advogado, ex-deputado e ex-vereador, com larga trajetória na defesa dos direitos humanos; e por Gabriel Aguiar (Psol), vereador, fenômeno das urnas nas ultimas eleições para a Câmara de Fortaleza. 

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Edição: Camila Garcia