A crise é estética, ética e política. Não podemos esquecer que a presidenta Dilma Rousseff (PT) sofreu um golpe ‘com o Supremo com tudo’ e que os deputados e senadores alegaram fazer isso por Deus, pela família e em memória de torturadores. Não esqueçamos que arte e cultura seguem sofrendo ataques cotidianos e que a imprensa pública sofre censura todos os dias.
Dito isto, quero aqui ecoar a vaia cearense que foi dada por servidores públicos, estudantes e professores da Universidade Federal do Ceará, ao lado de artistas, lideranças sindicais, movimento sociais populares e partidos de esquerda em frente à Reitoria da UFC ao interventor que nem merece ter seu nome registrado aqui.
Essa vaia, não foi dada apenas ao interventor da Universidade, mas também ao capetão que almeja invadir o Palácio da Abolição, ao outro capetão que tomou de assalto os Palácios da Alvorada e do Jaburu, além da Esplanada do Ministérios, Câmara, Senado, prefeituras, governos, parlamentos estaduais e municipais, judiciário e todo o território público e democrático que foi invadido pelo ódio, rancor e nojo que a burguesia brasileira lançou e lança diariamente contra nós trabalhadores.
Quando falo burguesia, me refiro aos banqueiros, donos da Havan, donos da Amazon, donos de shoppings, donos das grandes indústrias, aos agentes do agronegócio. Refiro-me aquelas pessoas que dominam quase todo dinheiro do mundo, enquanto o mundo quase todo não consegue pagar o gás, o pão de cada dia, a roupa de seus filhos e muito menos investir em seu futuro.
O caso da censura na Rádio Universitária da UFC demonstra também um dos aspectos mais estruturais em nosso Brasil, o racismo. Entre as justificativas para os ataques da Fundação de Cultura da UFC que gere a Rádio (instituição também sob intervenção) contra o professor Nonato Lima, servidor da UFC, jornalista e histórico coordenador da Rádio, por ele tocar em seu Programa e na programação da FM, músicas vinculadas às religiões de matriz africana e a cultura negra brasileira. É preciso derrotarmos o colonialismo racista que ainda reina na cultura brasileira e para isso precisamos falar sobre branquitude.
Não esqueçamos que o casal, que é branco, que invadiu o Palácio do Planalto, nas primeiras horas dentro do lugar mandou embora a importante obra Três Orixás da pintora Djanira da Motta e Silva, além de trocar as cadeiras com assentos vermelhos por cadeiras de assentos azuis. Repito, a crise é estética, ética e política. Nem as obras de arte sacra, as católicas, se livraram da sanha fascista deles, que empurraram tudo para o Jaburu.
Nós de esquerda, sobretudo os brancos como eu, precisamos entender que o racismo é uma estrutura relacional, que afeta negros e brancos, sendo que negativamente os primeiros e positivamente os segundos. Parte de estarmos vivendo essa miséria e terror absurdo em nosso país é, também, por não termos superado o racismo. Será difícil fazermos, mas enquanto nós brancos de esquerda não percebermos o quanto o racismo nos privilegia cotidianamente, não conseguiremos de fato nos irmanar enquanto classe para fazer a revolução.
Até porque a classe trabalhadora é majoritariamente preta, seja na indústria, seja no comércio seja no campo, seja onde for. O Projeto Popular para o Brasil nasce na luta abolicionista de Luís Gama, Luísa Mahin e tantas outras lutadoras e lutadores negros contra a escravidão.
*Trabalhador da cultura e militante social.
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
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Edição: Camila Garcia