Ceará

Comida saudável

Acesso à alimentação na infância influencia a saúde na vida adulta

Infelizmente nem todos os brasileiros podem escolher o que comer, faltam políticas que fomentem a alimentação saudável

Fortaleza, CE |
criança comendo
ter acesso a uma boa alimentação nos primeiros anos de vida é fundamental para que a criança se torne um adulto saudável - Camilla Lima

Um pratinho colorido e nutritivo. Poucas coisas são tão gratificantes para os pais do que ver seu filho se alimentando bem. Afinal, ter acesso a uma boa alimentação nos primeiros anos de vida é fundamental para que a criança se torne um adulto saudável. É o que explica a nutricionista Fabiana Fontes: “Nesse comecinho as crianças estão aprendendo a ter o paladar da fruta, a conhecer os alimentos, a ter o sentido dos sabores, saber o que é amargo, azedo, o que não é. Então a alimentação é fundamental pra você começar a criar um hábito alimentar saudável, pra que aquele adulto não coma só besteira, industrializados, então é na infância a base”.

Mas com tantas influências externas, principalmente da indústria alimentícia, que atua de forma intensa por meio da publicidade dirigida às crianças, o trabalho de equilíbrio em casa acaba sendo um grande desafio, mesmo para aquelas famílias que puderem já iniciar a introdução alimentar escolhendo bem os alimentos. Como na casa da empresária Ivna Pinheiro: “A alimentação é um tema que traz um pouco de aflição. Eu tenho 3 filhos e eles tem gostos bem distintos. Há uma dificuldade de montar um cardápio diverso com vários tipos de verduras, frutas e grãos, que seria o ideal, porque eles já estão numa idade - e eu tenho um filho de 8 anos, uma filha de 5 e outra de quase 3 - , em que são muito seletivos, aí fica um pouco difícil ser criativa nesses casos”, comenta. 

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Essa realidade seletiva não acontece só na casa da Ivna, não! Faz parte de um processo natural do nosso cérebro, que adora umas “facilidades” e que são, geralmente, muito bem satisfeitas pelos industrializados. A chefe de cozinha, educadora alimentar e especialista em alimentação infantil, Kika Hissa esclarece essa satisfação: “de forma geral eles tem muito açúcar, sal e gordura, que deixam seu sabor bem acentuado e fazem com que a gente tenha desejos por eles e que a gente queira sempre mais. E é muito mais fácil pra uma criança, e até mesmo pra um adulto, aceitar um biscoito, que tem sempre o mesmo padrão, a mesma cor, o mesmo sabor, do que uma fruta, por exemplo. Uma ameixa às vezes é mais azeda, às vezes é mais doce, às vezes é mais mole, outras vezes é mais firme, mais clara ou mais escura. Pro nosso cérebro é mais fácil reconhecer o que tem o mesmo padrão”.

Fabiana Fontes explica ainda que uma alimentação saudável é aquela rica em frutas, verduras, legumes e que o ideal é ofertar essa variedade de alimentos desde muito cedo. “Apresenta o brócolis, a cenoura, a batata-doce, o feijão. Vai variando as proteínas, um dia o frango, no outro dia o peixe”. A nutricionista ensina ainda que o ideal é evitar as frituras e retardar, o máximo possível, a apresentação dos industrializados para elas. “Refrigerantes, embutidos, enlatados, sobremesas, doces, devem ser evitados. Se aquela criança não tiver o costume, ela não vai sentir falta”, garante. A especialista defende que se deve deixar as guloseimas como algo pontual. 

Entretanto, dispensar as massas, frituras e os industrializados nem sempre é possível. Isso ocorre por diversos fatores que vão desde a situação socioeconômica, passando por hábitos culturais, a falta de tempo das pessoas e, vale ressaltar, pela influência da indústria alimentícia. Biscoitos e salgadinhos conseguem ser vendidos a preços mais acessíveis por serem produzidos em escala industrial. Também são mais fáceis de encontrar e de estocar.

Numa realidade de insegurança alimentar como a que vivenciamos hoje no país, tem sido ainda mais desafiador manter a qualidade alimentar das crianças que estão dentro do mapa da fome. Faltam políticas públicas que incentivem e fomentem a alimentação saudável. A julgar pelos incentivos à produção de soja, milho e outros no Brasil, os investimentos principalmente do governo federal, parecem ter outros objetivos.  Enquanto o país bate recordes na exportação de alimentos, sofre com o desmonte das políticas de combate à fome. 

È o que afirma Malvinier Macêdo, Presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ceará (Consea/CE): “É vergonhoso, é inadmissível, é desumano é o retrato da ausência de políticas públicas. Eu considero que falta vontade política por que vários exemplos nós já tivemos do que deu certo: os equipamentos públicos de segurança alimentar e nutricional, restaurantes populares, cozinhas comunitárias, bancos de alimentos porque é inadmissível que um país que produz tanto, que tem tantas terras agricultáveis, tem gente pra trabalhar, que tenha já ciência, pesquisa, deixe a população sem ter o que comer”, declara a conselheira.
 

Edição: Camila Garcia