Ceará

Racismo

Artigo | Racismo policial: técnicas de investigação e atuação da polícia cearense

Para que e para quem a segurança pública funciona? Não podemos nos enganar, nem achar que as estruturas são imparciais.

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
É preciso discutir sobre os procedimentos da corporação para que saibamos quais os critérios para ser inserido no catálogo e seus impactos na investigação policial. - Foto: SSPDS-CE

Acompanhamos no início de janeiro deste ano, diversas matérias sobre a aparição da foto do ator estadunidense, Michael B. Jordan, na lista de suspeitos da chacina da Sapiranga, bairro situado na cidade de Fortaleza, que terminou com a morte de cinco pessoas durante as festas natalinas. Diante do episódio fica a seguinte pergunta: quais são os critérios utilizados para entrar no catálogo de suspeitos da polícia cearense? Um questionamento que paira sobre as nossas cabeças e faz pensar “para que e para quem” a segurança pública funciona. 

Não é de hoje que conhecemos as práticas violentas utilizadas pela polícia contra a população negra. Ações que ajudam na perpetuação do racismo, como mostra o relatório ‘Pele alvo: a cor da violência policial’ organizado pela Rede de Observatórios da Segurança, publicado em 2020. Os dados afirmam que pessoas negras são as que mais morrem em ações policiais em 6 (seis) estados brasileiros: Bahia, Ceará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo. 

Na pesquisa, o Ceará, com um percentual de 62,3% de pessoas que se autodeclaram negras (pretas e pardas) em relação a população geral, ocupa a quarta posição com 87% de negros mortos pela polícia. Sendo assim, negros têm sete vezes mais chances de serem mortos que os não negros. A pesquisa também revelou outro problema, a subnotificação da cor das vítimas da violência policial, nos órgãos da segurança pública estadual. 

Além de ressaltar que na cidade de Fortaleza, a capital cearense, 100% das pessoas mortas pela polícia são negros. Dados assustadores de uma polícia que escancara seu racismo institucionalizado através das técnicas que possibilitam o assassinato do povo negro. Como vimos com na utilização da técnica do reconhecimento fotográfico onde foi encontrada a foto do ator B. Jordan, como o segundo suspeito da Chacina na Sapiranga. 

Também foram encontradas fotos de modelos negros e presos inocentes na mesma lista de suspeitos por crimes. Provas que deixam evidente qual a atuação da polícia quando se trata da população negra, e os critérios utilizados para perpetuar a violência e a discriminação racial. Ouso dizer que o ator estadunidense nunca pisou no Brasil, nem mesmo no Ceará, e mais, que não tem condenação alguma em nosso país que motive sua presença neste catálogo. 

Casos assim demonstram a violência e opressão que meninos e meninas negras vivenciam. Um estado de exceção que propicia a morte, através do ódio e do preconceito, e que ajuda na manutenção das desigualdades sociais. É importante compreendermos como isto afetada toda a sociedade. Não podemos nos enganar, ao achar que essas estruturas são imparciais. Elas são controladas por pessoas, empresas, instituições que também têm interesses, vontades e costumes.
 
E a polícia também é movida por seus interesses. É preciso discutir sobre os procedimentos da corporação para que saibamos quais os critérios para ser inserido no catálogo e seus impactos na investigação policial. Esperamos a transparência nos recursos utilizados nas investigações, no policiamento ostensivo e em outros setores. E que os órgãos de segurança pública do Ceará estabeleçam procedimentos que auxiliem na diminuição das subnotificações da cor das vítimas nos casos de violências policial.

É necessário realizar formações que promovam o debate sobre temas que fazem parte do cotidiano da sociedade como o combate ao racismo, violência policial, direitos humanos entre outras pautas importantes. Só assim combateremos toda forma de opressão produzida por essas estruturas. Observando como o racismo se (re)cria na atualidade, por meio de novos métodos, monitorando as estruturas sociais que reproduzem as desigualdades. 

Cobrando do Estado a implementação de políticas públicas de promoção da igualdade racial, em todas as esferas, e execução de condutas que ajudem na valorização da diversidade e na inclusão de todos. Só assim conseguiremos transformar essa realidade, pois, os problemas apresentados por esses métodos racistas são maiores do que podemos imaginar, e, mesmo que tentem invisibilizar, são sentidos, quando vemos os dados, depoimentos e a história de dor das pessoas negras. 

*Mulher negra, jornalista e doutoranda em comunicação pela Universidade Federal do Ceará.

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Camila Garcia