No dia 25 de novembro celebra-se o Dia Internacional da Não-Violência Contra a Mulher. A data foi escolhida para homenagear as irmãs Mirabal (Pátria, Minerva e Maria Teresa), dominicanas que ficaram conhecidas como Las Mariposas e se opuseram à ditadura de Rafael Leónidas Trujillo sendo assassinadas em 25 de novembro de 1960. Em 17 de dezembro de 1999, a Assembleia Geral das Nações Unidas declarou que o 25 de novembro seria o Dia Internacional da Não-Violência Contra a Mulher, em homenagem ao sacrifício de Las Mariposas.
O Brasil de Fato entrevistou Mariana Lacerda, cientista social e militante da Marcha Mundial das Mulheres para falar sobre a situação da violência contra a mulher no Ceará. Mariana informou que o isolamento social em meio a pandemia teve consequências diretas no aumento de violência das mais diversas formas contra mulheres. Confira.
Brasil de Fato – Qual a importância do dia 25 de novembro?
O 25 de novembro é uma data de referência para o movimento feminista mundial, que marca a luta pelo fim da violência contra as mulheres e compõe também as ações dos 16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres, uma maneira de anunciar para o mundo que as mulheres merecem viver sem violência, e que a violência contra a mulher está fora da ideia de mundo que queremos. E por isso promovemos esses 16 dias de ativismo, de conscientização, visibilidade, questionamento e de articulação politica para essa pauta.
Brasil de Fato – Quais os tipos de violência existente contra as mulheres e quais os mais comuns?
Nós trabalhamos com a ideia de cinco tipos de violência, entendendo que a violência é um ciclo, ou seja, ela nunca começa em seu estagio final, mas está ligada há um ciclo.
Ultimamente falamos muito sobre a violência psicológica, que é toda e qualquer conduta que gere danos emocionais às mulheres, ou seja, diminuição da autoestima que vá de encontro com sua saúde mental, ameaças, constrangimento, humilhação, manipulação, perseguição, controle, chantagem, limitação de exercer a liberdade, distorção da realidade, entre outras.
Ocorre também a violência física, que é toda ação que cause algum mal a integridade e saúde corporal da mulher, ou seja, apertões, puxões, empurrão, e outros mais graves como espancamento, lesões com objetos cortantes e no mais grave a morte da vítima.
Já a violência patrimonial está atrelada as relações familiares, condutas que configurem retenção dos valores e da condição da mulher de ser livre, através do controle de uso do seu próprio dinheiro, suspensão do pagamento de pensão, privar os bens da vítima. Então, por exemplo, em alguns casos vimos situações de mulheres que não conseguiam sair de casa porque seu companheiro estava em posse de seus bens, e em alguns casos destruíam a documentação de suas companheiras para que as mesmas não saíssem de dentro de casa.
A violência moral é aquela que busca caluniar a integridade da mulher, por injúria e difamação, quando você acusa sem nenhuma prova a mulher de traição, ou expõe a vítima que já está passando por situação de constrangimento, rebaixar com xingamento e tentar desvalorizar pela forma como ela se veste ou se comporta.
E por último, a violência sexual, que trata de qualquer conduta que constrange a mulher, como forçar uma relação sexual não desejada, estupro, obrigar a mulher a fazer atos sexuais que elas não queiram, pois se sentem desconfortáveis, impedir o uso de métodos contraceptivos, forçar a mulher a interromper a gravidez, forçar o casamento e relações sexuais dentro do casamento. Então tudo isso se encaixa dentro da violência sexual, e vale lembrar que depois do não, tudo é assédio.
Brasil de Fato – Com a pandemia e o isolamento social, as pessoas passaram a ficar mais tempo dentro de casa, isso alterou os dados sobre violência contra as mulheres?
Acho que podemos responder a essa pergunta se perguntando a princípio o que é o lugar da casa para a mulher. Muitas vezes esse lugar é um local de profundas violências, onde a violência doméstica e sexual acontecem de forma constante. Muitas pesquisas mostraram que durante esse período de isolamento a violência contra mulheres aumentou em um número significativo. Então precisamos descortinar esse conceito de casa ser um lugar seguro para as mulheres, porque traz também um lugar de insegurança, além disso, se tem preocupação em denunciar o agressor e algo ser feito contra a vítima, e enquanto mãe, ficam os questionamentos de onde os filhos irão ficar.
Durante esse momento houve também um aumento no número de campanhas de denúncias de violências e, consequentemente, teve um aumento no número de denúncias. Então precisamos passar essa mensagem ao mundo, de que não queremos violência e, sobretudo, que essas violências não aconteçam dentro de nossas casas, onde deve ser um lugar que nos dê segurança, tranquilidade e conforto.
Brasil de Fato – Na sua opinião, as mulheres que sofrem algum tipo de violência são amparadas pelo Estado?
O Estado é opressor e patriarcal. Pelo menos durante o governo Lula-Dilma existiu sim um conjunto de políticas que foram construídas com o objetivo de minimizar as desigualdades e interromper essas violências que as mulheres sofrem. Foram criadas uma série de políticas desde coordenadorias, conselhos, disks, casa abrigo, casa da mulher brasileira, ou seja, um complexo de políticas para coibir essa prática da violência.
Já no atual governo, o que vemos é um total esvaziamento dessa pauta, inclusive com sobra de recurso do ministério responsável pela pasta de mulheres, em que a ministra Damares não chegou a utilizar todo o orçamento disponível ao seu ministério, enquanto o número de violências só aumenta. Então acho que devemos debater e construir políticas de Estado que estejam relacionadas diretamente com a prevenção da violência, então, construir políticas que garantam autonomia, trabalho e renda, moradia, lazer, que garantam que as mulheres consigam romper com seus violadores.
Brasil de Fato – Quais são as redes de proteção que mulheres que sofrem agressão tem para denunciar e se proteger de seus agressores?
Existe nacionalmente o canal “Disk 180”, para você denunciar qualquer prática de violência contra as mulheres.
Aqui no Ceará e em outros estados existe a Casa da Mulher Brasileira, que é um conjunto de recursos que no primeiro momento da violência prestam assistência as mulheres e fazem um acompanhamento prévio.
Os movimentos populares, mesmo não possuindo essa tarefa, conseguem dar um norte e alguma orientação para as vítimas, encaminhando ao CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) para fazer um acompanhamento mental e psicológico.
E também as Delegacias das Mulheres, instaladas em alguns municípios do nosso estado.
Gostaria de pedir para que conheçam a Marcha Mundial das Mulheres, que conheçam nossas lutas e nosso trabalho. Além disso, pedir para que todos e todas se engajem nessa luta, na luta contra a violência às mulheres e que, principalmente quando presenciarem algum confronto entre casais que interfiram, porque em briga de marido e mulher a gente mete a colher sim.
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Edição: Francisco Barbosa