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Militância e ativismo

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Nossa intenção não é hierarquizar ou confrontar militância e ativismo, mas problematizar alguns desafios postos nessa conjuntura tão adversa. - Foto: Juliana Adriano
Podemos afirmar que a popularização desses termos acabou contribuindo para o uso inadequado.

Desde o processo do golpe de 2016, com o acirramento das lutas e embates políticos no país, duas palavras que antes eram muito restritas a espaços próprios dos movimentos populares e partidos políticos, sobretudo de esquerda, foram incorporadas no vocabulário mais cotidiano, trata-se dos conceitos de militância e ativismo. 

De um lado, podemos afirmar que a popularização desses termos acabou contribuindo para o uso inadequado dos mesmos, tratados quase sempre como sinônimos por indivíduos identificados com bandeiras progressistas que, nas redes sociais, se autoproclamam militantes e ativistas de causas nobres e relevantes. Do outro, passaram a ser associados a rótulos pejorativos como “petralhas”, esquerdistas e vândalos, com o objetivo de deslegitimar ações e discursos de resistência ao impeachment, ao governo Temer e ao bolsonarismo, por parte da direta e da extrema direita.

Militância é um projeto coletivo e voluntário que pessoas optam em trilhar em determinado momento de suas vidas. Ser militante implica num desvencilhamento de posições egoístas, vaidosas e individualistas para a assimilação de um senso de solidariedade e generosidade autêntico. Inflexão moral que muitas vezes carrega contradições difíceis de serem superadas, a reprodução dos valores que sustentam o modo de reprodução capitalista, o patriarcado e o racismo também é observada entre militantes, espaços e grupos comprometidos com as lutas por liberdade e igualdade. Na militância, desejos e ideias pessoais são submetidas ao debate entre os pares para serem avaliadas, ajustadas ou refutadas. Além disso, a dedicação para a construção de uma organização coletiva é outra exigência, contribuindo materialmente, participando de encontros, comprometendo-se com as deliberações, convidando novos membros e zelando pelo seu funcionamento, seja um sindicato, um movimento social, uma associação ou um partido político. Portanto, a militância é uma práxis (ação e teoria) coletiva, planejada e permanente.

Já o ativismo é uma atitude política mais difusa e ocasional perante determinada situação, que não implica necessariamente num comprometimento tão altruísta como na militância. Nessa perspectiva, sujeitos ou grupos agem em apoio ou crítica a pautas e situações que julgam serem relevantes socialmente, a partir de campanhas ou atividades que buscam um objetivo comum, podendo ser mediado, ou não, por alguma organização. Muitos ativistas, anônimos ou famosos, até rejeitam estruturas organizativas mais rígidas e representativas, como as mencionadas anteriormente. No Brasil, inúmeros ativistas e ativismos têm sido fundamentais na defesa da democracia, sejam nas mídias alternativas, na promoção dos direitos humanos, na proteção do meio ambiente, etc, mesmo com seus limites e heterogeneidade. 

Nossa intenção não é hierarquizar ou confrontar militância e ativismo, mas problematizar alguns desafios postos nessa conjuntura tão adversa, como as dificuldades em se formar novos militantes, em enraizar as experiências dos movimentos e organizações populares, de traduzir pautas e bandeiras progressistas para parcelas da população sob forte influência de grupos religiosos fundamentalistas e construir a unidade necessária na diversidade das formas de organização e luta que combatem as várias opressões que estruturam e moldam a sociedade brasileira.

Edição: Francisco Barbosa