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O governo Camilo e os servidores estaduais

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Camilo Santana tem construído uma aliança ampla durante os seus dois mandatos, inclusive se fortalecendo como uma das principais lideranças políticas do estado. - Foto: CUT
Governo Camilo tem estabelecido uma relação tensa com a grande maioria dos servidores públicos.

Em qualquer governo, seja em âmbito federal, estadual ou municipal, independente se sua composição política, as tensões e conflitos entre servidores e gestores públicos são permanentes, sobretudo, na fase atual do capitalismo, sob o domínio do rentismo neoliberal, em que o Estado assume posições opostas aos interesses das classes populares, flexibilizando e/ou destruindo direitos sociais e trabalhistas conquistados ao longo da história.

No estado do Ceará, desde 2015, o Palácio da Abolição é ocupado por Camilo Santana, do Partido dos Trabalhadores (PT), numa aliança já estabelecida há mais de uma década com os irmãos Ferreira Gomes, hoje no Partido Democrático Trabalhista (PDT). Inclusive, o atual governador foi secretário de Cid Gomes em duas pastas, Desenvolvimento Agrário e Cidades.

Camilo Santana tem construído uma aliança ampla durante os seus dois mandatos, inclusive se fortalecendo como uma das principais lideranças políticas do estado, com uma relativa independência dos pedetistas e, até mesmo, do seu próprio partido. Para se ter uma ideia, dos 46 deputados estaduais, apenas 8 fazem oposição ao governador, além das ótimas avaliações de sua gestão, segundo várias pesquisas e, de acordo com a Plataforma BR, o chefe do executivo cearense é considerado o governador do Brasil mais influente nas redes sociais. 

Nesse cenário de conforto e estabilidade, a partir dos êxitos em suas alianças e na sua popularidade, o governo Camilo tem estabelecido uma relação tensa com a grande maioria dos servidores públicos estaduais. Negociações infrutíferas e o não-atendimento de boa parte das demandas das várias categoriais de servidores, são marcas de suas gestões. Mesmo com a expansão do quadro de servidores em algumas áreas como a educação básica e a segurança, as demandas e reivindicações represadas, além da carência de servidores em inúmeros órgãos, estão se avolumando a cada ano, provocando uma desvalorização acentuada da renda do funcionalismo estadual e a precarização do trabalho.

Levantamento realizado pelo Fórum de Associações e Sindicatos dos Servidores Públicos Estaduais do Ceará (FUASPEC), sob coordenação do Sindicato dos Fazendários, aponta perdas salariais de 31,7% do conjunto do funcionalismo estadual, somente nos últimos sete anos. Soma-se a isso a aprovação da reforma previdenciária dos servidores que, dentre os retrocessos: altera as idades mínimas para aposentadoria, de 60 para 65 para homens e de 55 para 62 para mulheres; reduz a pensão por óbito de 100% para 60% e a taxação de 14% do valor das aposentadorias que excederem dois salários mínimos. Sem mencionar no recente caso de chantagem sobre os profissionais da educação no processo de vacinação, já discutido nessa coluna.

Tais posturas e inciativas acabam impactando negativamente na qualidade dos serviços prestados à população e na valorização do funcionalismo. Uma consequência que também não pode ser minimizada é a própria perda de apoio político que essas ações e omissões provocam no interior dessas inúmeras categorias de servidores, que também tem sido importantes para as vitórias eleitorais das forças progressistas no Ceará.

Ao mesmo tempo, alguns sindicatos e associações, orientados por posições sectárias, ao realizarem o embate necessário para a defesa dos interesses e direitos dos trabalhadores do Estado, acabam nivelando a administração de Camilo ao destrate do governo Bolsonaro, o que, além de uma miopia analítica inconsequente, não contribui para explorar as contradições existentes na coalização que sustenta o governo estadual e assim poder avançar em conquistas imediatas e estratégicas dos servidores estaduais. O governo estadual, mesmo liderado pelo PT, é permeado por contradições próprias de conciliações e arranjos entre grupos e setores com interesses conflitantes, mas não deve ser entendido como um inimigo a ser batido pelas representações dos servidores, em particular nesse cenário atual.

Há muitos anos, o estado do Ceará é conhecido por sua saúde fiscal e superávits comerciais, e até se gaba disso, o que ajuda a desconstruir alguns “argumentos técnicos” de que não existe margem orçamentária para a garantia e ampliação dos direitos dos servidores. A defesa das pautas do funcionalismo público, que passa por reposição salarial justa, condições de trabalho adequadas e por uma carreira digna, não são exigências corporativas, mas demandas de uma sociedade atravessada por desigualdades profundas, acentuadas nesse período aberto pela pandemia.

Ações de curto, médio e longo prazo que enfrentem essas desigualdades não podem ser pontuais ou filantrópicas, mas permanentes e estruturantes, que apenas políticas públicas sólidas e servidores qualificados e valorizados podem elaborar e executar, não nos iludamos.

Edição: Francisco Barbosa