Para as forças democráticas a política passional é uma de suas principais inimigas.
É obvio que as paixões influenciam algumas ações humanas, inclusive àquelas mais objetivas e realistas, como a política. Porém, desde os clássicos da antiguidade, a pedra angular dessa ação humana deve ser a racionalidade, justamente para nortear as relações sociais para além dos excessos próprios dos desejos humanos.
No Brasil, podemos afirmar, de forma categórica, que a passionalidade tem dominado as análises e discursos políticos nos últimos anos, inclusive no interior das diversas forças da esquerda, dificultando as articulações e alianças necessárias para derrotarmos a extrema direita e o projeto ultraliberal que tem sido implementado no país desde o Golpe de 2016.
O bolsonarismo se alimenta e joga muito bem com essa política passional, sobretudo, na arregimentação de sua base mais aguerrida. Muito do que mobiliza os chamados bolsominions ou parte considerável do antipetismo, são ilações e sentimentos inflados num campo muito próximo à irracionalidade, o que dificulta um diálogo mais frutífero com esse público, seja no almoço de domingo com a família ou no espaço público.
O mais grave, porém, é quando essa embriaguez política é reproduzida por lideranças, grupos e sujeitos identificados com as pautas e bandeiras historicamente defendidas pelos setores progressistas. As redes sociais parecem ter amplificado posições, a partir de textões ou frases de lacração, que pouco contribuem para decifrarmos a esfinge que tem devorado direitos e vidas do povo brasileiro.
Soma-se a isso, a manipulação de dados e logaritmos que as plataformas digitais promovem, induzindo e conformando bolhas de opinião pública que são difíceis de serem furadas. Tais bolhas servem para o neofascismo como uma blindagem para suas fake news e teses obscurantistas. Porém, essas mesmas bolhas, acabam criando uma espécie de zona de conforto para a circulação de ideias e opiniões no campo da esquerda.
Se para a extrema direita a política passional é determinante para sua sobrevivência e fortalecimento, para as forças democráticas é uma de suas principais inimigas. Os porta-vozes e intelectuais do primeiro grupo, nada têm de ingenuidade na adoção de estratégias que estimulam posturas e atitudes cegas de seus seguidores e simpatizantes. Já no segundo grupo, essa ingenuidade parece aflorar entre a militância e lideranças, bloqueando inciativas que possibilitem a unidade necessária para combater o bolsonarismo nas instituições e nas ruas, impedindo a ampliação de sua influência na sociedade e, não menos importante, dificultando a formação de uma frente que garanta a vitória nas eleições presidenciais de 2022.
Superar essa passionalidade que impera na política brasileira é uma tarefa urgente para que, mesmo com as divergências e embates políticos, tenhamos condições de trilharmos um caminho oposto à barbárie em curso.
Edição: Francisco Barbosa