Atendendo a convite do presidente da Câmara de Altaneira, o vereador Deza Soares (PT), o professor Nicolau Neto apresentou ainda no mês de maio, o Plano Municipal de Combate ao Racismo e de Construção da Equidade Racial.
Inicialmente, Nicolau argumentou que o plano foi construído por volta de setembro de 2020 e que a intenção era entregar para as duas chapas que concorreram ao executivo municipal nas eleições 2020, mas que se viu frustrado nesse intento devido ao avanço da pandemia da covid-19. Destacou outrossim, que o documento já tinha sido apresentado no último dia 13 de maio, data e que se relembra os 133 anos da abolição inconclusa, junto a secretários municipais, diretores e coordenadores escolares, formadores educacionais, representação sindical e vereadores, inclusive com sugestões de propostas ao plano.
Para Nicolau, o município de Altaneira será o primeiro do Cariri a ter um documento dessa vertente histórica e que a Câmara estava dando um passo importante ao se voltar para a discussão do combate ao racismo e para a construção de políticas compensatórias para a população negra e agradeceu, antes de iniciar a apresentação, ao casa em nome do presidente.
Como está estruturado o Plano
O professor afirmou que o documento está estruturado da seguinte forma: apresentação, justificativa e propostas. Disse que História do Brasil se confunde com a história do processo de escravização da população negra e indígena e que ao longo dos anos governantes brasileiros, de imperadores a presidentes, foram responsáveis pela promoção e perpetuação da desigualdade racial e citou como exemplos a Lei de Terras de 1850 e a Lei da Vadiagem de 1942.
O racismo é visto e sentido institucionalmente. Hoje com essa nova conjuntura política está cada vez mais latente. Mas apesar desse extermínio, a população negra existe e resiste. Ele trouxe para o plenário virtual da Câmara dados que sustentou sua discussão, mencionando que a grande maioria das pessoas que estão nas delegacias são de pele negra (75%) e que a população negra não se sente representada nos espaços de poder na medida em que esse grupo tem apenas 15% dos juízes; 30% no Senado; 20% na Câmara Federal e não há nenhuma representação de ministros no STF.
"O ministério do atual governo é composto por homens brancos. O município de Altaneira, por exemplo, segue esses dados. No Poder Legislativo, das 19 candidaturas à casa em 2020, apenas três se autodeclararam preta e destas, duas conseguiram sair vitoriosas nas urnas, o que representa só 22,2%. Mas não consegui ainda perceber um discurso de combate ao racismo dessas candidaturas que lograram êxito”, asseverou.
Segundo Nicolau, diante deste cenário, é preciso trazer para o centro das discussões a pauta racial, pois mudar e transformar cada espaço passa necessariamente pelo combate ao racismo e concomitantemente pela promoção da equidade e para tanto, é fundamental a construção de ações afirmativas, compensatórias concretas e viáveis.
“O enfrentamento as desigualdades advindas do racismo em todos os setores é uma responsabilidade e um dever de todos e não simplesmente da população negra como muitos querem fazer crer”, pontuou.
Conforme disse, é com essa mentalidade que tanto o poder executivo municipal quanto o legislativo precisam assumir seu papel na luta antirracista disseminando o debate a respeito da questão racial, contribuindo para desarranjar todas as formas de discriminação e preconceito presentes diariamente.
Nicolau pontuou oito propostas, a saber: 1 - Transformação do dia 20 de novembro, hoje ponto facultativo no município através da Lei Nº 674, de 1º de fevereiro de 2017, em feriado; 2 - Criação de uma lei municipal que estabeleça cotas em concursos públicos para candidatos e candidatas que se autodeclarem pretos; 3 - Articular e, ou, firmar parcerias com universidades da região visando a formação de uma banca de heteroidentificação voltada para avaliar os pedidos de cota nos concursos públicos; 4 - Criação de um Conselho dentro da Secretaria Municipal de Educação denominado de COPERA (Conselho de Promoção da Equidade Racial em Altaneira). Este Conselho terá, dentre outras responsabilidades estabelecidas em lei aprovada na Câmara, fiscalizar se as leis 10.639/03 e 11.645/08 que tornam obrigatório o ensino da cultura africana, afro-brasileira e a história e cultura indígena nas escolas públicas estão sendo cumpridas; 5 - Criação, através de lei, do Estatuto Municipal da Equidade Racial que adotará os parâmetros do Estatuto da Igualdade Racial do Governo Federal aprovado em 2010; 6 - Elaboração e desenvolvimento pela Secretaria Municipal de Educação de programas de formação sobre relações étnico-raciais em todas as instituições de ensino envolvendo toda a comunidade escolar; 7 - Desenvolvimento pelas Secretarias Municipais de Educação, de Cultura e de Assistência Social de editais voltados para a promoção da Equidade Racial e de Gênero no município e 8 - Implementação de Conferências Municipais de Combate ao Racismo Estrutural. Estas serão realizadas a cada dois anos.
Ele chegou a mencionar também proposta que foram sugeridas no último dia 13 como a criação do Fórum Municipal da Diversidade e de um Fundo Municipal para o desenvolvimento de políticas afirmativas.
O que disseram os vereadores
Dos oito parlamentares presentes virtualmente, seis se manifestaram. Silvânia Andrade (PT) disse reconhecer o trabalho e o empenho do professor Nicolau no combate ao racismo e o parabenizou pela iniciativa. Na mesma linha de raciocínio, Geaneo (PT) comentou que o trabalho de Nicolau tem alcance nacional e disse para ele continuar na luta.
Já o professor e vereador Nonato (PT) fez uma comparação do momento com o Dia do Desafio, pois é um “desafio implementação de um plano de tamanha magnitude”, ao passo que disse se sentia feliz enquanto professor e historiador "de poder discutir um plano de combate ao racismo" e se colocou a disposição para somar na luta”.
A advogada e vereadora Rafaela Gonçalves (PT) voltou a destacar que a intelectualidade de Nicolau é “um verdadeiro patrimônio que o município de Altaneira dispõe” e lembrou que o racismo é crime inafiançável previsto na Constituição Federal de 1988. Disse também que se sentiu feliz ao perceber que uma das suas propostas já estava contemplada no plano – as cotas raciais em concurso público.
O vereador Ariovaldo Soares (PDT) argumentou que o professor Nicolau Neto é uma referência no combate ao racismo. Ao passo que se mostrou favorável as cotas raciais, apontou como proposta a criação de um departamento para enfrentamento ao racismo e em prol da igualdade racial.
Por último, falou o presidente da casa. Deza Soares (PT) teceu agradecimento ao professor Nicolau pelo aceite do convite e frisou que o trabalho do professor é como uma inspiração e de grande relevância para o nosso e outros Municípios e se comprometeu para contribuir com a causa e somar na luta para construir um plano de combate ao racismo e equidade racial.
Nas considerações finais, Nicolau disse que irá agregar todas as sugestões apresentadas e que tão logo esteja concluído irá entregar aos dois poderes (Executivo e Legislativo) para darem efetividade ao documento.
Apenas a vereadora Robercivânia Oliveira (PSD) e o vereador Valmir Brasil (PDT) se mantiveram em silêncio sobre a temática.