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Artigo | Insegurança alimentar e pandemia: e o Ceará, como está?

Pobreza e fome são interligadas, exigindo ainda mais o urgente redesenho e implementação de politicas públicas.

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
No caso do Ceará, com os efeitos da pandemia, se fez necessária a adoção pela gestão estadual de medidas para minimizar os impactos negativos de ordem econômica e social. - Foto: Thiago Gadelha / Seplag-CE

Desde 2020, o mundo vem atravessando a pandemia da covid-19, e essa situação tem alterado de vários modos e em diversos aspectos a vida das pessoas, trazendo dificuldades múltiplas. 

Nesse cenário, a fome aparece com força e exigindo medidas que revertam esse quadro. No caso do Brasil, que havia saído do mapa da fome em 2014, de acordo com os critérios da FAO-ONU, o crescente número de pessoas que não tem acesso a alimentos de forma regular e permanente, nos últimos cinco anos, com um cenário em que à crise econômica que já estava em curso, juntou-se a crise sanitária, causando o aprofundamento da violação do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), uma vez que os segmentos mais vulneráveis da população são os mais afetados pela insegurança alimentar e nutricional.

Outro entrave que são as desigualdades regionais, onde aparecem em maior relevo as carências econômicas e, consequentemente, alimentares, nas regiões Norte e Nordeste, que quando comparadas às demais, observa-se que voltaram ao patamar de insegurança alimentar que havia no ano de 2004, fato comprovado pelo recém-lançado Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 o Brasil, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Segurança Alimentar e Nutricional.

Acrescente-se que, desde 2016, vem sendo tomadas medidas pelo poder central que desmontaram políticas públicas na área da agricultura familiar como a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário; aprovação de medidas de austeridade fiscal através da Emenda Constitucional 95, que congelou recursos para investimentos públicos por vinte anos, prejudicando especialmente setores como a saúde, a educação a assistência social, com destaque para o total desmonte do sistema de segurança alimentar e nutricional, que nos últimos anos vinha avançando em sua construção.

Ao nos reportarmos ao Ceará, os dados de pesquisa mostram que a insegurança alimentar e nutricional está presente, em moradias no meio rural e nos centros urbanos, conforme a Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE, referente aos anos de 2018-2019, divulgada em 2020, onde havia no Ceará, 1,3 milhão de domicílios em situação de insegurança alimentar, em seus diferentes níveis: leve, moderada ou grave.

Mais recentemente, conforme dados do documento Análise da (In)segurança alimentar do Ceará, a partir dos dados da Pesquisa Regional por Amostra de Domicílios do estado do Ceará – PRAD, publicada no início deste ano, com dados coletados em 2019, pelo Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), tem-se 44,2% dos domicílios com índice de insegurança alimentar em algum grau. Ainda no referido documento aparece que na zona rural o percentual de segurança alimentar é de 46,8%, abaixo do apresentado na zona urbana que é de 58,3%.
Nos últimos meses de 2020, o número de desocupação no Ceará chegou a 14,4%, o que reflete na deterioração da qualidade de vida de parcela da população que tem suas condições, muitas vezes, já fragilizadas.

No caso do Ceará, com os efeitos da pandemia, se fez necessária a adoção pela gestão estadual de medidas para minimizar os impactos negativos de ordem econômica e social junto à população mais vulnerável, tais como a distribuição de vale gás, a isenção de contas de fornecimento de energia e água, o cartão vale-alimentação para estudantes, o auxílio para profissionais que tiveram suas atividades prejudicadas, a exemplo de profissionais de eventos, como humoristas, cantores, e ainda profissionais de bares, restaurantes, transportes alternativos, ambulantes e feirantes. No entanto, destaca-se a importância que tais medidas devem ter sempre o viés e a perspectiva do Direito à Alimentação, como também a garantia do respeito às múltiplas características, inclusive, de preservação da identidade regional e da cultura alimentar, do acesso à informação, do direito a escolha, à produção e ao consumo saudável, mesmo em situações emergenciais, como a que estamos vivenciando no presente momento.

Pobreza e fome são interligadas, exigindo ainda mais o urgente redesenho e implementação de politicas públicas para o enfrentamento à grave situação de vulnerabilidade social de tantas famílias.

*Diretora Adjunta do Esplar e Presidenta do Consea Ceará

**Gerente da Célula de SAN da Secretaria da Proteção Social e Vice-Presidenta do Consea Ceará

Edição: Francisco Barbosa