As classes sociais não podem ser observadas apenas por essa dimensão econômica.
As classes A e B se mantêm estáveis no país. As classes C e D são as mais afetadas pela inflação. A classe E volta a ser impactada pela fome… Quantas vezes você já viu em jornais, revistas e noticiários alusões às classes sociais como se fossem letras? Esse tipo de analogia possui uma intenção tácita de ocultar as contradições econômicas, políticas e culturais que determinam as formações, movimentações e consciência das classes sociais em torno de seus interesses imediatos e históricos.
De acordo com a tradição do pensamento marxista, as classes sociais são determinadas a partir da posição que possuem diante dos meios de produção, ou seja, se ela é proprietária ou não dos instrumentos que produzem a riqueza material em determinada sociedade. No modo de produção capitalista, duas classes sociais fundamentais vêm se desenvolvendo ao longo do tempo, a classe trabalhadora e a burguesia. Porém, essas classes não são homogêneas, no interior delas existe uma diversidade que deve ser compreendida sob pena de fazermos uma análise simplória da realidade.
Operários, camponeses, trabalhadores autônomos e informais, funcionários públicos, empregados do setor de serviços e os próprios desempregados formam a classe trabalhadora, e mesmo em cada um desses ramos também encontramos diferenças importantes. Ainda existe a classe média, composta majoritariamente por servidores do alto escalão do Estado, assalariados em determinados postos da iniciativa privada e profissionais liberais que possuem rendimentos elevados e uma posição social privilegiada. Até a burguesia não é uniforme, existem frações financeiras, industriais, agrárias e comerciais que a conformam, sendo necessários, esforços permanentes de mediação de alguns conflitos que existem entre elas. Ainda há setores burgueses grandes, médios e pequenos, que possuem uma relação de desequilíbrio nas disputas cada vez mais selvagens da dinâmica capitalista.
As classes sociais não podem ser observadas apenas por essa dimensão econômica que expus acima. Para atuarem enquanto forças concretas e consequentes na sociedade, as classes devem se organizar, ter consciência de seus objetivos e lutar por eles. Para isso, a construção de sindicatos, associações, partidos, editoras e jornais, além de forjar seus dirigentes e intelectuais, são iniciativas fundamentais que as classes se empenham ao longo da história para conquistar suas demandas, difundir suas visões de mundo e disputar o poder.
Essa falaciosa classificação alfabética, portanto, reproduzida inclusive em meios acadêmicos, não evidencia a materialidade e a complexidade que envolve questões crucias relacionadas ao entendimento das classes sociais no Brasil, como a tímida mobilidade social, as desigualdades raciais e de gênero, a baixíssima remuneração da força de trabalho, a profunda concentração de renda, o avanço da precarização e da superexploração do trabalho, a natureza antidemocrática das elites brasileiras, os desafios das lutas populares, dentre outras.
Essa estratégia de tratamento do tema das classes sociais é reforçada a partir da difusão de ideologias neoliberais como o empreendedorismo e a meritocracia, difundidas diuturnamente pela mídia e, infelizmente, impregnadas nas escolas e universidades brasileiras, que retiram dessa discussão elementos como o conflito e a coletividade, transferindo para o indivíduo a responsabilidade pelo seu “sucesso ou fracasso”, como os coaches que dominam as redes sociais.
As classes A, B, C, D, E, X, Y ou Z não existem, a não ser na desfaçatez e discursos dissimulados dos veículos e porta vozes de um modo de produção e de vida que pouco tem a oferecer para a grande maioria da população trabalhadora.
Edição: Francisco Barbosa