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No Ceará, setor da cultura deve receber R$138 milhões da Lei Aldir Blanc

Dane de Jade, coordenadora do Escritório Regional de Cultura Cariri acredita que a verba será repassada nesse semestre.

Brasil de Fato | Crato (CE) |
Gestores de cultura aguardam o repasse dos R$ 3 bilhões destinados pela Lei, enquanto realizam reunião para definir como se dará a utilização do recurso. - Foto: Divulgação / GOVCE

O Brasil de Fato CE conversou com Dane de Jade, Coordenadora do Escritório Regional de Cultura Cariri e Coordenadora da Vila da Música/Crato, sobre como vem se dando o processo de implantação da Lei de Emergência Cultural Aldir Blanc (nº 14.017/2020).

O Projeto de Lei (PL) 1075/2020, de autoria da deputada federal pelo Rio de Janeiro, Benedita da Silva (PT), foi construído por uma articulação de deputados com o setor da cultura depois que muitas mobilizações foram realizadas pela sociedade cobrando que a então secretária especial de cultura, Regina Duarte, utilizasse os recursos do Fundo Nacional de Cultura em políticas emergenciais para que os trabalhadores da cultura, assim como espaços culturais geridos por microempreendedores, pudessem enfrentar a pandemia.

O PL, que pelo Senado não possui nenhum voto contrário e cujos parlamentares, que tinham destaques, retiraram para que o Projeto não precisasse voltar à Câmara e sim fosse direto para aprovação no Palácio do Planalto, ainda no dia 4 de junho, mas a Lei só foi sancionada, ainda com veto, pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no dia 29, sendo publicada sob o nº 14.017/2020 no Diário Oficial da União do dia seguinte, 30 de junho.

Agora, gestores de cultura aguardam o repasse dos R$ 3 bilhões destinados pela Lei, enquanto realizam reunião para definir como se dará a utilização do recurso. O Ceará receberá R$ 138 milhões, ficando R$ 71 milhões sob responsabilidade do estado e os R$ 67 milhões restantes com os municípios. O recurso será distribuído de três formas: pagamento de auxílio emergencial de R$ 600 mensais aos trabalhadores da cultura, subsídio mensal a espaços culturais e, políticas de incentivo à produções culturais, como editais e prêmios.

Brasil de Fato CE: Qual a importância da Lei de Emergência Cultural Aldir Blanc para o setor cultural nacional e, especificamente, para o Ceará?

Dane de Jade: Em março de 2020, fomos pegos de surpresa pela pandemia da covid-19. Deputados e deputadas apresentaram projetos de lei com o intuito de proteger o setor cultural que foi severamente prejudicado devido o isolamento social. As propostas dos projetos de lei foram reunidas na PL 1075/2020, de autoria da deputada Benedita da Silva (PT/RJ). A partir disso, coube à relatora, deputada Jandira Feghali (PCdoB/RJ), construir um texto que, após inúmeras webs conferências e discussões com movimentos sociais, sociedade civil e diversos setores culturais, transformou-se em um documento que reunia aquilo que o setor cultural precisava. O documento logo virou a Lei, nomeada por ela de Aldir Blanc. A Lei de Emergência Cultural Aldir Blanc, portanto, surgiu com o objetivo de ajudar os trabalhadores da cultura e os espaços culturais brasileiros nesse período de isolamento social ocasionado pela pandemia da covid-19. Entendendo que, devido o isolamento, muitos trabalhadores, trabalhadoras e espaços culturais perderam renda, a Lei visa fornecer um auxílio emergencial dedicado a essas pessoas e centros culturais, bem como promover o fomento à cultura. Por isso a importância para nosso estado. Uma movimentação foi gerada em torno disso, aproximando a cadeia cultural, sociedade civil e poder público numa corrente de busca pelo SMC – Sistema Municipal de Cultura e seu CPF (Conselho, Plano e Fundo Municipal), uma mobilização que há muito não se via em torno da causa cultural.

BdF CE: Qual foi o papel dos trabalhadores da cultura na implantação da Lei Aldir Blanc, que vai destinar R$ 3 bilhões para o setor, dos quais o Ceará receberá R$ 138 milhões?

Dane: O movimento nasce na sociedade civil, que busca nos seus parlamentares uma saída para “fome” instaurada no setor cultural, o primeiro a parar e, provavelmente, o último a voltar, soluções emergenciais. E depois de uma grande articulação, sociedade civil e parlamentares, orquestrados pela deputada, Jandira Feghali, é aprovada, com quase 100% na Câmara dos Deputados Federais e 100% no Senado, a Lei de Emergência Cultural Aldir Blanc, que foi sancionada, no dia 29 de junho de 2020, ainda com veto, pelo Presidente da República.

BdF CE: Como que será definido quem recebe a renda básica emergencial? Quem paga? O município onde o trabalhador reside ou é o estado?

Dane: Como falamos antes, o estado vem pactuando com os municípios e de forma integrada com os estados, de que o estado poderá assumir a renda, uma vez que essa ação exige especificidades tecnológicas que o estado possui, mas nada ainda está certo. Pois a Lei dá total autonomia aos municípios para que executem os 3 eixos da lei (renda, espaços e fomento). Só terá direito a renda o sujeito que não recebeu a renda básica emergencial do governo federal. Aquele que já recebe auxílio INSS, ou é contratado de qualquer setor público, também não terá direito. Será para os que farão jus às especificidades da Lei com relação à renda.

BdF CE: Qual a previsão para o Governo Federal repassar aos estados a verba? Qual a previsão para início das primeiras liberações para os beneficiados?

Dane: Essa verba deverá ser repassada aos estados e municípios ainda esse semestre, e acreditamos que até agosto isso já tenha sido resolvido. E aí cada município terá até 60 dias para começar o repasse aos beneficiários.

BdF CE: Como será feita a seleção e distribuição dos recursos para manutenção dos espaços culturais do estado? Será via recurso dos municípios, do estado ou uma junção dos dois?

Dane: A partir das instruções normativas que deverão vir com o repasse, cada estado e município poderá, dentro dessas normativas, criar balizadores, e aí, acreditamos, serão criadas normativas que facilitem aos estados e municípios essa seleção. De qualquer forma o estado já sinaliza, e vem pactuando com os municípios, a “autodeclaração”, passando para o beneficiário a responsabilidade da declaração. Acreditamos que os municípios farão isso de forma local e o estado entrará complementando, mas tudo poderá ser direcionado de outras formas, a partir da regulamentação do governo federal teremos mais clareza. Essa verba deverá ser repassada aos estados e municípios ainda esse semestre, e cremos que até agosto isso já tenha se resolvido. É quando cada município terá até 60 dias para começar o repasse aos beneficiários.

BdF CE: Uma outra forma prevista de repasse de utilização dos recursos é através de editais de fomento. Tem alguma definição de como serão realizados esses editais? Eles serão via os instrumentos que já existem como o Edital de Incentivo às Artes da Secult CE ou o Edital da Temporada de Arte Cearense do Dragão do Mar ou ainda através de editais específicos como foi o do Cultura Dendicasa?

Dane: A Lei prevê, como coração dos processos ao direito aos benefícios, um cadastro. E através desse cadastro, de forma muito mais fidedigna, cada estado e município terá sua demanda da cadeia cultural, e com ela, poderão direcionar, de forma emergencial, mas a médio prazo, editais, prêmios e aquisição de bens, que beneficiem a produção cultural elencada nos cadastros, fazendo de fato valer as demandas da localidade. Cada município terá autonomia para realizar seus editais.

BdF CE: Como você analisa a entrada desse recurso em nosso estado em relação a economia no geral?

Dane: O segmento da cultura de um local movimenta sozinho um grande percentual na cadeia econômica do território. Essa injeção de verba irá alavancar a cadeia econômica de forma geral. Aumentando o fluxo da economia e a criação de bens simbólicos, isso em si já é um ganho para arte e cultura. É claro que ainda é pouco para estruturarmos um setor de tamanha importância, mas é um caminho que precisamos alargar. Como diz nosso secretário de cultura do estado: “estamos em estado de conferência, de resistência e de emergência”.

BdF CE: Por fim, não é uma pergunta, mas se houver algo que você queira comentar que não falamos anteriormente fique à vontade.

Dane: Penso que existe algo a se processar diante tudo isso, é hora de (re)avaliarmos, planejarmos, (re)organizarmos e (re)alinharmos a cultura, pois ela se constitui como vetor de transformação e desenvolvimento social e tem uma capacidade incrível de criar sinergias.
 

Edição: Francisco Barbosa