Ceará

Gastronomia

Conheça o "pratinho", comida típica cearense que é destaque além do período junino

É muito comum observar diversas vendinhas nas ruas que ofertam esse produto e no período junino o seu consumo aumenta

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
Para o professor e consultor de gastronomia, Roberio Marques, o pratinho é na verdade um elemento não só cultural, mas também um elemento social - Foto: Divulgação

O pratinho é um tipo de comida bastante tradicional no Ceará. É muito comum observar diversas vendinhas nas ruas que ofertam esse produto e no período junino o seu consumo e vendas ganham ainda mais destaque. Mas como o pratinho ganhou tanta força no estado a ponto de se caracterizar como uma comida típica? Para o professor e consultor de gastronomia, Roberio Marques, o pratinho é na verdade um elemento não só cultural, mas também um elemento social porque, de acordo com ele, surgiu da necessidade de ter uma refeição mais prática e mais barata. “Então o pratinho hoje ganha varias formas e aí ele se populariza tanto no Ceará porque a gente consegue traduzir um pouco de uma cultura que é nossa. A gente faz uma mescla com vários tipos de alimentos e preparações, alguns extremamente típicos daqui, característicos, outros que ganham enraizamento com outras culturas”.

De acordo com ele, essa costura entre culturas é muito forte na construção do pratinho como, por exemplo, o vatapá de frango que se tornou tradicional no estado. “Quando a gente vai fazer uma busca pela produção do vatapá, a gente percebe que outros estados também têm uma base do vatapá, como o Maranhão e a Bahia, que tem um preparo específico da base do vatapá, que ganha essa nova roupagem quando chega no território cearense porque ele ganha outros incrementos mais populares como o frango. Então, deixa-se de utilizar uma proteína que é um pouco mais cara, como o camarão, e passa-se a utilizar uma proteína um pouco mais barata, um pouco mais simplificada”. 

O pratinho acaba se tornando um alimento democrático, “então a gente vai vendo que o pratinho se populariza porque ele consegue permear, ele consegue perpassar por todas as classes sociais de acordo com a sua estrutura e no caso, de acordo com o seu valor também”, afirma. 

Roberio explica que o pratinho se adequa a determinado tipo de mercado, a um eixo específico. Para ele, o pratinho é um produto que está sendo consumido em diversos locais, formas e tamanhos, com diferentes tipos de preparo e isso é uma tipologia muito forte, principalmente no São João, mas que vai muito além do período junino. “A gente pode ter pratinhos mais simples da dona Maria que vende na esquina a pratinhos gourmets, a pratinhos mais desenvolvidos, com estruturas mais bem trabalhadas, com alimentos, com insumos, com ingredientes com mais qualidade, digamos assim, e aí, claro, com agregação de preço de acordo com cada tipo de produção”.

O comércio de pratinhos

Jefferson Araújo e Eva Rodrigues são proprietários do Eva Comidas Típicas que há vinte anos vende comidas na praça gastronômica no bairro Cidade 2000. Ele afirma que toda a renda da família vem das vendas dos pratinhos. Com a crise ocasionada pelo coronavírus, explica que ainda continuam vendendo por delivery. “Antes da covid-19 fazíamos para janta, hoje também entregamos para o almoço”.

As vendas, de acordo com ele, tiveram início nas festas juninas, e logo após esse período os clientes começaram a procurá-los para consumir a refeição e até hoje continuam pedindo. Sobre a refeição cair no gosto da população, Jefferson diz que “sabemos que baião, vatapá de camarão, paçoca e carne de sol fazem parte de nossa culinária cearense então porque não comer todo dia?”.

A chefa de cozinha e microempresária da “Pratinhos da Faby”, Fabiany Oliveira, mais conhecida como Faby, afirma que sempre trabalhou com pratinhos e que já está há quase 11 anos no ramo. De acordo com ela, a renda da família também vem das vendas dos pratinhos. “Tenho muito orgulho de manter minha família assim”.

Desde quanto o isolamento social iniciou, Faby diz que teve que se reinventar para atender seus clientes, e até afirma que as vendas tiveram um aumento. “Nesse período de isolamento estamos nos reinventando já que a nossa venda era somente no local, hoje temos delivery e aumentamos a propaganda nas redes sociais, usamos todas possíveis”.

Para ela, o que faz o pratinho ser um sucesso de vendas é a sua praticidade. “Acredito que o sucesso do pratinho nos dias de hoje tem haver com a praticidade na hora de montar e o atendimento se torna mais rápido, pra quem chega cansado do trabalho e não quer cozinhar”.

Saudades

A jornalista, Vivianne Rodrigues, está morando há dois anos e meio em São Paulo e, de acordo com ela, foi um pouco difícil acreditar que por lá não vende pratinho. “Pode ser difícil acreditar, mas São Paulo não tem pratinho. É de cortar o coração. Eu até saí perguntando para os meus amigos paulistas, só que eles não conheciam esse refinado conceito gastronômico cearense”.

Nesse período que está em São Paulo, ela afirma que sente falta do pratinho e que, consequentemente, também sente saudade do Ceará. “A experiência que eu tenho é da ausência. Dá uma saudade tremenda do Ceará, ainda mais em tempos de confinamento. Pratinho é amor em forma de comida. Daquele jeito que só cearense sabe fazer”. E lembrar um pouco do período em que morava no Ceará. “Não tinha essa de período não, onde tinha pratinho eu ia. A dificuldade para mim hoje, na verdade, é encontrar pratinho vegano. Mas já tem uma galera inovando e sempre teremos a duplinha infalível: baião de dois”.

Sobre o pratinho ter se tornado uma comida típica cearense, ela diz. “Ah, eu acho que é uma tradição que vai além da comida, sabe? Tem a tia do pratinho que geralmente é uma figura icônica, tem o tempero caseiro, tem a questão do preço acessível, além de ocupar os espaços públicos, né? As praças, ruas do bairro. Então gera todo um movimento ao redor do pratinho. Devia ser patrimônio cultural”.

Edição: Monyse Ravena