Os dias do mês de junho protagonizaram um acontecimento que considero de coragem e organização política pelos direitos das mulheres do Cariri cearense, região que possui um extenso histórico de abusos contra mulheres, violência doméstica e feminicídio. Trata-se do movimento #exposedcariri, que relata assédios sexuais, abusos e estupros sofridos por adolescentes, jovens e mulheres denunciados através do Twitter.
Muitos casos expõem agressores sendo professores de escolas na rede pública, cursinhos, universidades e funcionários de tais instituições. O #exposedcariri obteve alcance nacional e os casos seguem em investigação.
Feito o contexto, é oportuno falar sobre abusos contra mulheres, violência doméstica e feminicídios executados à corpos pretos. Entre os diversos motivos que me levam a falar sobre a violência que se impõe aos nosso corpos, um deles trata-se da naturalização da violência contra mulheres negras.
Muito se fala dos estupros praticados pelos senhores as mulheres negras no período escravocrata, mas esse tema não é aprofundado, sendo que dificilmente as consequências políticas e sociais na vida das mulheres negras são a pauta da discussão.
Outro fator é o silenciamento histórico a que somos submetidas, silenciamento sobre nossas vidas, nossas dores, nossos ódios, as violências sofridas relacionadas a subjetividade, sentimentos e outras condições.
Aprofundar conhecimentos sobre esses aspectos é importante para tirá-los da inércia do pensamento de que o racismo está no passado, que já passou e já acabou. Este passado é presente no cotidiano da negritude e mais ainda da mulher negra, que cotidianamente sofre com a exposição violenta do seu corpo.
No Brasil, a Globeleza é um exemplo concreto da erotização das negras, fortalecido durante muitas décadas pela mídia televisiva.
Como versa um texto do Coletivo Pretas Simoa publicado em 2014 “Esta é a única vez onde a beleza da mulher negra, reduzida a região inferior traseira, ganha vez na televisão para anunciar o produto bom, bundudo e barato ofertado para o entretenimento dos foliões estrangeiros que movimentam a economia turística do país. No resto do ano, sabemos bem o espaço que a televisão brasileira nos reserva: a cozinha ou a prisão”.
A exposição de imagens negativas de mulheres negras na televisão, nos cinemas, nos livros didáticos e nas redes sociais deturpam nossa imagem na mentalidade dos homens brancos que nos enxergam como objetos de prazer e pancadas. Meninas negras são também diretamente golpeadas por essa deturpação, tendo sua autoconfiança e autoestima abalada.
Pois bem, que as denúncias de abusos e violências realizadas por mulheres negras sejam repercutidas e efetivadas, a seletividade de repercussões e alcances contribuam para que nada mude na vida daquelas que sofrem duplamente, entendendo que o sexismo e o racismo andam de mãos dadas, nessa sociedade que nos marca todos os dias com sua violência.
*Bibliotecária, doutoranda em Ciência da Informação pela UFPB.
Edição: Monyse Ravena