Como um profissional da Saúde está se sentindo agora? A longa e custosa formação, os artigos lidos, os numerosos treinamentos e a experiência adquirida no tempo não pesam mais. São uma mentira. Você que está enfrentando a pandemia é alarmista, afirma algo que não existe.
Tenho um amigo cearense que é médico e trabalha no Rio de Janeiro. Resolveu fazer Medicina em outro Estado e foi financiado pelo FIES, criado no governo FHC e expandido de forma abrupta nos primeiros governos do PT.
A onda anti-esquerda cresceu. Ele criticou o programa Mais Médicos, por pura conveniência usou o passado escravista como argumento. Repetia as conspirações sobre o financiamento do comunismo na Venezuela e a necessidade de um Estado mínimo. Nos primeiros dias da pandemia ainda me mandava alguma seleção de correntes de whatsapp: o vírus chinês, a conspiração para derrubar o presidente, etc.
Os casos foram aumentando, mas a negação sobre a gravidade da pandemia se manteve na elite política bolsonarista. Dia ou outro, o presidente faz o que não é para fazer. Sai, fala, tosse, cospe, toca e aglomera. O profissional de saúde perdeu a tranquilidade do sono. Um tanto envergonhado, meu amigo passou a discordar mais, conseguiu ultrapassar a negação. Duramente, aprendeu um limite para o seu apoio.
Já tinha visto isso antes. Os atuais no governo federal alimentam e se alimentam de um longo negacionismo histórico que, entre outros temas, recusa o passado autoritário e doloroso da Ditadura de 1964. Agora, defendem um negacionismo sanitário. Prevendo a queda de popularidade, desviam a responsabilidade e se omitem.
A desgraça atual aproximou o médico e o historiador, os inimigos contra os quais não se é necessário escutar. O veto presidencial ao projeto que regulamenta a profissão de Historiador foi mais um episódio dessa longa guerra contra a ciência e as universidades.
É urgente enfrentar o negacionismo em bloco, não só para aumentar a crença no conhecimento, mas para torna-lo mais democrático e sensível a um público maior. Nosso desafio também é a simples recusa da mentira, dissimulação e ocultação em cada fala e pronunciamento.
*Renato Freire é doutorando em história pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e professor da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN)
Edição: Monyse Ravena